A família PNAD: explicando a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

Estudantes subgrupo de empregos e salários [1]

A partir de entrevistas em diversos domicílios brasileiros, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) coleta dados para a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), que é importante instrumento para a formulação, validação e avaliação de políticas direcionadas ao desenvolvimento socioeconômico e a melhoria das condições de vida no país. Em seu modelo contínuo (PNAD Contínua), a pesquisa visa produzir indicadores para acompanhar flutuações trimestrais e a evolução a médio e longo prazo da força de trabalho, dentre outras informações.

É comum tratarmos os resultados da pesquisa do ponto de vista estatístico, esquecendo, por vezes, que a pesquisa é um retrato da realidade nacional, isto é, são seres humanos que se encontram naquelas diversas situações. Assim, com a finalidade de entender os principais conceitos referentes a essa pesquisa e desconstruir a noção puramente matemática que, por vezes, informa as análises, conheceremos um pouco da história dos membros da Família Pereira Nascimento Almeida Dias, a família PNAD, uma família brasileira que vivencia diferentes realidades quando o assunto é sua inserção no mercado de trabalho.

Essa família de tantos sobrenomes é composta por 8 pessoas, dentre elas, Maria. Nossa personagem principal tem 40 anos e é mãe de 3 filhos: Juninho, Camila e Júlio César. Próximo a sua casa, mora seu pai, Sr. Antônio, e seu irmão, Augusto, com seus 2 filhos, Rafaela e Marcelo. Coincidentemente, cada habitante desses dois domicílios é classificado de acordo com diferentes categorias da pesquisa. Nesse sentido, essa família exemplifica, com suas posições no mercado de trabalho, os conceitos da PNAD Contínua. Abaixo segue um retrato da nossa família PNAD. Em seguida, apresentamos cada membro da família, explicando a situação que aquela pessoa se encontra em relação à inserção no mercado de trabalho. O Marcos, nosso técnico de pesquisa do IBGE, irá nos ajudar nesta empreitada. Nesta apresentação, destacamos quantos brasileiros (as) se encontram em cada situação, com base nos dados da pesquisa para o quarto trimestre de 2020. O objetivo, vale a pena reforçar, é convidar o leitor a refletir sobre o lado humano da pesquisa, afinal ela retrata o difícil cenário que muitos brasileiros e brasileiras estão enfrentando.

Olá, meu nome é Marcos, sou técnico de pesquisa do IBGE. Hoje vamos conhecer um pouco sobre os indicadores do mercado de trabalho a partir da realidade da família Pereira Nascimento Almeida Dias. Vamos começar? Conheceremos algumas categorias importantes para a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios e a situação de cada integrante da família.


População abaixo da idade de trabalhar (Menor de 14 anos): Olá, eu sou o Juninho, filho da Maria, tenho 4 anos e por isso não posso trabalhar. Na PNAD Contínua, pessoas com menos de 14 anos são consideradas abaixo da idade de trabalhar.  Todos os outros membros da minha família estão dentro da População em idade de trabalhar, pois eles possuem 14 anos ou mais. Mas, nem todas as pessoas que possuem idade para trabalhar estão trabalhando, há algumas que nem sequer estão à procura de uma inserção no mercado de trabalho. Do total da população brasileira em idade de trabalhar (176,362 milhões), no 4º trimestre de 2020, 100,1 milhões se encontravam na Força de Trabalho, isto é, estavam ocupadas ou desocupadas. Meu irmão, Júlio César, é um dos milhões de brasileiros que estão desocupados. Olha ele aí embaixo, explicando a situação.

Desocupado: Eai?! Meu nome é Julio César, sou o filho mais velho da Maria. Ultimamente, as coisas estão difíceis por aqui, pois mesmo buscando emprego e estando disponível para começar a qualquer momento, não tenho conseguido nada. A situação econômica do país não está nada fácil. Apesar de ter terminado meus estudos em engenharia, não consegui encontrar nenhuma oportunidade no mercado de trabalho. No 4º trimestre de 2020 existiam 13,9 milhões de pessoas nessa situação. Estou na categoria de desocupados, mas espero sair logo dessa situação e entrar para o grupo de Ocupados. Os ocupados são as pessoas que trabalharam pelo menos uma hora completa em trabalho remunerado em dinheiro, produtos, mercadorias ou benefícios (moradia, alimentação, roupas, treinamento etc.) na semana de referência da pesquisa. No 4º trimestre de 2020 existiam 86,1 milhões de pessoas nessa situação. Não vejo o momento de me juntar a eles. Meu tio, Augusto, está ocupado, o que é muito bom, mas, o melhor é que ele trabalha horas consideradas suficientes. Olha ele aí embaixo, explicando.

Ocupado com horas suficientes: Olá, eu sou o Augusto, irmão da Maria e filho do Antônio. Sou diretor financeiro de uma empresa de comércio de mármore e granito. Comecei cedo na firma como técnico em contabilidade, com o passar do tempo, consegui passar na faculdade de ciências contábeis, me formei e consegui esse cargo na empresa. Sou bem satisfeito financeiramente, trabalho de segunda a sexta, de 8 às 18h, e consigo ficar livre no final de semana para curtir com a minha família.  Estou feliz pela minha situação, mas ando preocupado com minha sobrinha, Camila. Ela também está nesse grupo de ocupados, como eu, isto é, ela tem um emprego. Mas, ela está trabalhando menos horas do que deseja e, por isso, integra o grupo de subocupados por horas insuficientes. Aí embaixo, ela explica como está sendo enfrentar essa situação:

Subocupada por horas insuficientes: Oi, eu sou a Camila, filha da Maria. Sou formada em biologia e dou aulas na escola do meu bairro, mas como não tinham muitas turmas, só consegui dar aulas no turno da manhã! Estou trabalhando 20 horas por semana, mas gostaria de trabalhar mais. Não somente gostaria, eu preciso. Como estou precisando aumentar a minha renda mensal, comprei uns utensílios e comecei a fazer bolo pra vender nessas horas disponíveis para complementar a renda. Eu vi no jornal que o número de pessoas que trabalham menos horas que desejariam, assim como eu, está crescendo no país. Na matéria, eles explicam que as pessoas nessa situação são denominadas de subocupadas. Eu sou subocupada, já que só dou 20h de aulas semanais e gostaria de trabalhar por mais horas. Difícil é acreditar, como disseram no jornal, que 6,9 milhões de pessoas estão em uma situação parecida como a minha.


Olá pessoal, sou o Marcos do IBGE, lembram? Pois é, na família PNAD, como vimos, o Augusto e a Camila estão trabalhando. Mesmo que em uma situação distinta, ambos estão no grupo de ocupados. Já o Júlio César está enfrentando uma barra à procura de emprego. No mercado de trabalho em geral, tanto as pessoas ocupadas quanto as desocupadas integram a Força de Trabalho. Mas, há, de acordo com o 4º trimestre de 2020, 76,2 milhões que estão Fora da Força de Trabalho, isto é, nem estão ocupados, nem estão procurando uma ocupação. Essa pode ser uma situação confortável para alguns que estão fora da Força de Trabalho Potencial (FTP), mas também pode ser expressão de uma situação dramática, para outros, que estão na FTP. Outros membros da família PNAD nos ajudam a entender isso.


Fora da força de trabalho potencial: Olá pessoal, eu sou o Antônio Pereira, pai da Maria e do Augusto. Em janeiro, eu comemorei 73 anos de idade, sou aposentado e por isso, de acordo com o IBGE, estou fora da força de trabalho. Com minha aposentadoria consigo pagar as contas e até dá para dar uma força pro Júlio César, meu neto, que está desempregado. No meu tempo era muito melhor, viu? Era impensável um engenheiro formado procurando emprego. Júlio até veio falar comigo, dizendo que quer trabalhar como Uber. Eu disse para ele esperar e continuar batalhando por um emprego com carteira de trabalho assinada, pois eu ainda posso ajudar por um tempo. A Maria, minha filha, sofre muito, pois não é fácil ter um filho nessa situação. Ela quer trabalhar fora para ajudar, coitada. Ela está aí, na batalha, procurando um emprego, mas não está disponível para trabalhar, pois tem que cuidar do Juninho. É por isso que ela está na Força de trabalho potencial, que é o conjunto de pessoas de 14 anos ou mais de idade que não estavam ocupadas nem desocupadas na semana de referência, mas que possuíam um potencial de se transformarem em força de trabalho. No 4° Trimestre de 2020, havia 11,315 milhões de pessoas nessa situação.

→ Buscou trabalho, mas não estava disponível:  Meu nome é Maria, tenho 40 anos e sou mãe solo de 3 jovens. O mais novo, Juninho, ainda é dependente de meus cuidados e o mais velho, Júlio César, perdeu seu emprego e passa os dias procurando por uma nova oportunidade. A renda da minha casa depende da minha filha, Camila e da força que meu pai está dando. Por isso, eu decidi procurar por uma ocupação. No entanto, apesar de nessas últimas semanas estar buscando por um trabalho, eu não poderia assumir esse novo posto, já que preciso estar em casa para cuidar dos afazeres domésticos e cuidar do meu filho mais novo, pois ainda não consegui uma vaga na creche para ele. A Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio me classifica no grupo de pessoas que buscaram trabalho, mas não estavam disponíveis para trabalhar. Pior do que eu só a Rafa, minha sobrinha, ela está procurando emprego há um tempão e não acha. Já desistiu, tadinha.

Desalentado: Ei gente, tudo bem?! Meu nome é Rafaela, sou filha do Augusto, tenho 28 anos e sou técnica em recursos humanos. Meu último emprego foi há 3 anos. Lá eu era assistente de RH. Depois de 8 meses da minha contratação, a empresa encerrou as atividades na cidade. Permaneci por mais 1 ano em busca de uma oportunidade, mas não encontrei. Foi então que decidi vir para a capital do meu estado tentar me realocar no mercado de trabalho, mas, infelizmente, não encontrei vagas. Com a crise econômica e a pandemia, parece que não encontrarei tão cedo uma vaga. De acordo com o IBGE, eu estou no grupo das pessoas desalentadas, ou seja, aquelas pessoas que, por algum motivo, desistiram de procurar emprego.  No 4º trimestre de 2020 existiam 5,7 milhões de pessoas nessa situação. Estamos na torcida, aqui em casa, pro tio Júlio César conseguir um bom emprego. Assim, o vovô volta a dar uma força nas contas aqui de casa. Quem sabe em algum momento, a situação melhora para mim também. Nosso objetivo, aqui em casa, é deixar o Marcelo, meu irmão, estudando, sem precisar trabalhar, mas está cada vez mais difícil.

→ Não desalentado: Olá! Eu sou filho do Augusto e me chamo Marcelo. Estou cursando o segundo ano da faculdade de Letras na Universidade Federal do meu estado. Com o apoio da minha família, estou me dedicando aos estudos e, por isso, não estou procurando um emprego no momento. Mas, com a situação da Rafa, se surgisse uma oportunidade eu estaria disponível. Segundo o IBGE, essa minha situação de não estar procurando um trabalho, mas estar disponível caso surgisse, é considerada como não desalentada. Diferente da minha irmã Rafaela, que é desalentada, ainda não busquei um emprego porque não seria interessante para mim agora.


Ei pessoal, olha eu aqui, o Marcos. Assim como alguns integrantes da família PNAD, existem muitos brasileiros na condição de subutilizados. Mas, o que é isso? É como se fosse um desperdício da força de trabalho do nosso país, sabe? É o caso do Júlio César, que está desempregado; da Camila, que está subocupada; e de todos os outros que estão na Força de Trabalho Potencial (a Maria, a Rafaela e o Marcelo). O que a PNAD faz é somar todas as pessoas que estão nessas três situações e as reunir nesse grupo de subutilizados.  Esse grupo representa a quantidade de pessoas ou mão de obra que não são utilizados no mercado de trabalho, por faltar uma ocupação adequada. Esse conceito foi incorporado após discussões em âmbito internacional junto à Organização Internacional do Trabalho (OIT), e é considerada a forma mais precisa para compreender um dos indicadores da precarização no mercado de trabalho. No 4º trimestre de 2020, cerca de 32 milhões de pessoas estavam nessa situação.


Ei gente, olha eu aqui novamente, o Juninho. Essa é a minha família e foi muito bom poder mostrar para vocês um pouco da nossa situação, que não está muito fácil, não é? Tá todo mundo ralando, já que só a minha irmã, Camila, e o tio Augusto estão trabalhando. Meu sonho é poder ir pra creche, assim, minha mãe pode voltar a trabalhar e eu posso estudar, afinal, também quero ter um emprego logo logo e, assim, conseguir dar uma força aqui em casa.


NOTAS

[1] Contribuíram diretamente para a redação desta análise Gisele Paiva Furieri, Luiz Carlos Santos, Luiza Giubert, Otavio Luis Barbosa, Patrícia Specimille e Ruth Stein Silva.
Esta entrada foi publicada em O Conjuntura Explica e marcada com a tag , , , , , , , , , , , , , , , , , , , . Adicione o link permanente aos seus favoritos.