– Por Cássia Rocha –
A atividade cresce rapidamente em vários países e é promissora para a segurança alimentar mundial. Pesquisadores da Base Oceanográfica da Ufes pretendem compartilhar o conhecimento científico sobre a prática com a comunidade, a fim de otimizar a atividade pesqueira do estado
A aquicultura ou cultivo de organismos aquáticos consiste na criação e reprodução de peixes, algas, crustáceos ou moluscos em ambientes confinados e sob condições controladas.
Uma das vantagens desse modelo em relação à pesca exploratória é a preservação dos ecossistemas marítimos, já que não há o risco de extinção de espécies na criação em cativeiro. Estudos da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) mostram que 80% dos estoques pesqueiros estão sobre-explorados, o que indica a importância da aquicultura para a segurança alimentar. Estimativas da FAO apontam que este será o setor produtor de alimentos que mais crescerá no mundo. Além disso, o cultivo é mais previsível, o que aumenta a homogeneidade dos alimentos e reduz os custos, garantindo um produto mais barato.
Apesar de ter sido introduzida no Brasil há mais de um século, a aquicultura ainda está nos primeiros passos, se comparada a outras atividades de produção animal em que o país se destaca mundialmente.A participação brasileira no cultivo de organismos aquáticos é de cerca de 0,8%, aponta a FAO.
A produção nacional se baseia principalmente em unidades de pequena escala (com exceção do camarão marinho, que corresponde a até 14% do total). São aproximadamente cem mil fazendas aquícolas, ocupando 80 mil hectares, o que equivale ao território do município capixaba de Cachoeiro de Itapemirim. Segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a área ocupada é semelhante a dos principais países produtores, e, devido à grande região costeira e ao clima, o Brasil tem potencial para ampliar a atividade.
Diante desse cenário, a aquicultura despertou o interesse de pesquisadores de vários lugares do mundo, inclusive de estudiosos da Ufes que atuam na Base Oceanográfica localizada em Santa Cruz, no município de Aracruz. Três unidades constituem os Laboratórios Integrados da Base Oceanográfica e trabalham de forma integrada na temática da aquicultura: o Laboratório de Zooplâncton, o de Ecotoxicologia e o de Cultivo de Organismos Marinhos (LabCOM).
Da microalga ao peixe
A Base Oceanográfica está instalada em espaço cedido pela prefeitura de Aracruz, onde há água com qualidade adequada para a aquicultura. Além disso, o município conta com ampla oferta de espécies nativas, localiza-se em uma região de grande desembarque pesqueiro e tem intensa atividade nesse ramo, com destaque para o camarão e o robalo.
A equipe de pesquisadores conta com bolsistas de iniciação científica, mestrandos, doutorandos e pós-doutorandos auxiliados por técnicos de laboratório, sob coordenação do professor Luiz Fernando Loureiro Fernandes. Como a maioria dos estudantes reside na Grande Vitória, um dos desafios para desenvolver os estudos é o transporte até a Base.
No laboratório, são desenvolvidos projetos de pesquisa e inovação em larvicultura, alimentação de organismos, desova e repovoamento de espécies ameaçadas por sobre-exploração. “O objetivo do LabCOM é disponibilizar para a comunidade local pacotes tecnológicos compostos por pesquisas relacionadas à vida marinha, a fim de otimizar a atividade pesqueira do estado. A aquicultura é o principal objeto de estudo atualmente”, diz Fernandes.
As pesquisas relativas à aquicultura incluem toda a cadeia alimentar. “A base é o cultivo de microalgas. Elas servem de alimento para os zooplânctons, que vêm logo acima na cadeia alimentar. Temos outro
laboratório para cultivo do zooplâncton, que é alimento vivo para as larvas de peixe”, explica.
O laboratório começou com estudos sobre caranguejo-uçá, o que lhe rendeu o Prêmio Mercocidades, em 2011. O projeto feito junto à prefeitura de Vitória visou ao repovoamento da espécie. “Os caranguejos sofrem sobrecata. Além disso, na década passada, a chamada doença do caranguejo letárgico acometeu a região. As populações ainda estão em fase de recuperação, já que demoram cerca de sete anos para se desenvolver e os manguezais sofrem impacto direto por poluição e ocupação”, destaca o coordenador. Depois dessa pesquisa, o laboratório ampliou o seu trabalho e incluiu os peixes, porque era uma demanda social. Foram realizados experimentos, principalmente para a engorda de algumas espécies.
Potencial não explorado
O Espírito Santo possui uma grande diversidade de espécies nativas altamente favoráveis ao desenvolvimento da aquicultura, porém, para Fernandes, esse potencial não é aproveitado: “A técnica quase não é utilizada no estado. Predomina a pesca em mar aberto, na região costeira. Hoje se tem basicamente o cultivo que ocorre em Guarapari”.
Na avaliação do professor, o método mais adequado para o Espírito Santo é a maricultura, ou seja, a aquicultura desenvolvida exclusivamente em água salgada. Nessa modalidade, os organismos são mantidos em seu habitat natural, porém se delimita a área a que eles terão acesso. A maricultura
é mais utilizada no Brasil para o cultivo de camarões, ostras e mariscos.
“A aquicultura ainda vai ter um grande impacto sobre a alimentação, porque o estado tem um grande problema com sobrepesca e uma série de outros impactos antrópicos que afetam a qualidade do pescado, principalmente depois do desastre no Rio Doce. O laboratório acompanha o desenvolvimento das espécies nativas para tentar minimizar esses impactos”, salienta Fernandes. O professor acrescenta que novas pesquisas buscam promover ações de repovoamento, por meio da introdução das espécies que perderam população devido à tragédia.
No intuito de ampliar a atuação dos laboratórios, encontra-se em andamento um projeto de adequação das instalações visando a pesquisas voltadas para a larvicultura de espécies marinhas nativas. Tais estudos subsidiarão programas governamentais de incentivo a projetos de maricultura para os pescadores artesanais do Espírito Santo e demais entidades interessadas. As pesquisas também têm em mira a recomposição dos estoques pesqueiros por meio do repovoamento das espécies ameaçadas ou de interesse econômico.
Presente e futuro
Atualmente, a equipe desenvolve um projeto inovador com o peixe vermelho dentão (Lutjanus jocu), para fazer sua desova em laboratório, o que será realizado pela primeira vez. O LabCOM tem as espécies que compõem todo o ciclo da cadeia alimentar, desde a base até o topo: quando os peixes se reproduzirem, já haverá alimento para as larvas. “O laboratório acompanha todas as fases, desde que a fêmea produz o alevino, até o desenvolvimento dele nos primeiros estágios, juvenis”, ressalta Fernandes.
A iniciativa é financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes) e tem parceria com o Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) e com o Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes, campus de Piúma). O Incaper é responsável por providenciar o alimento vivo para os recém-nascidos e por produzir a ração; o Ifes se encarrega do fornecimento de óleos para incrementar a ração e ainda da reutilização do refugo da pesca para alimentação dos peixes. O objetivo do projeto é fechar todo o ciclo de desenvolvimento dessa espécie: da reprodução à produção de alevinos, alimentação com alimento vivo, desmame (início do uso da ração) e crescimento, até chegar à comercialização, feita pela comunidade.
Entre os programas em andamento, também está a criação de misídeos (grupos de crustáceos) em laboratório para estudos ecotoxicológicos e alimentares, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científi co e Tecnológico (CNPq). “Além desses, temos um projeto com tainhas e outro que visa ao aproveitamento do resto de alimento vivo, que é trabalhado com copépodos (microcrustáceos), ambos em parceria com o Incaper. E temos o cultivo de microalgas, que é uma atividade contínua. Por conta da restrição de espaço, é o que é possível ser feito”, destaca o coordenador.
Os estudos buscam se dedicar a espécies que têm melhor crescimento e que se revertem em maior benefício para a comunidade como fonte de renda. O professor destaca que “o objetivo de gerar este ‘pacote tecnológico’, este modo de fazer a coisa, é transferir o conhecimento para a comunidade”.
Os dados gerados nos Laboratórios Integrados são tabulados, para traçar diagnósticos e cenários futuros. “As pesquisas são desenvolvidas por meio de tentativas, testes aplicados em cada espécie. Toda a informação obtida passa a fazer parte de um ‘pacote tecnológico’ que serve de base para os próximos experimentos do laboratório”, afirma Fernandes. Os dados poderão suprir a ausência de estatísticas e estudos sobre o setor da aquicultura e seu desenvolvimento produtivo, além de serem usados para o planejamento de políticas públicas.
Como pa4ticipar , para aprender?
Faço parte de um projeto para inserçao social de dependente químicos.
Gostaría muito de aprender e desenvolver juntos com os internos a pratica da criançao de peixes .
os contatos estão disponíveis neste link: https://oceanografia.ufes.br/pt-br/geral
Gostaríamo muiiiito de ter o suporte pedagógico para desenvolver um laboratório aqui para desenvolver e ensinar aos internos. Assim , eles poderam desenvolver uma fonte extra de renda para sua subsistência pós tratamento