– Por Ana Clara Andrade* –
Localizada a mais de mil quilômetros da costa brasileira, a Ilha da Trindade foi palco para a descoberta de uma nova espécie de peixe do gênero Acyrtus (foto) – conhecido popularmente como peixe-ventosa – por pesquisadores da Ufes. O local faz parte do arquipélago Martin Vaz, que desperta o interesse dos estudiosos por sua biodiversidade.
A novidade é o Acyrtus simon, uma espécie endêmica da região. O nome é uma homenagem a Thiony Simon, doutor em biologia animal pela Ufes, que faleceu em um mergulho durante seu pós-doutorado. A equipe responsável por organizar os estudos no local foi formada por pesquisadores do Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (USP), do Laboratório de Ictiologia (IctioLab) da Ufes, do Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da California Academy of Sciences, em colaboração com a Marinha do Brasil.
A pesquisa
Com início em 1995, a pesquisa em Trindade já dura 28 anos. O biólogo e especialista em taxonomia João Luiz Gasparini, pesquisador associado do IctioLab, foi um dos primeiros do ramo da ictiologia a estudar o local. Desde então, já realizou oito expedições científicas à ilha. “O meu tempo trabalhando com essa área me fez ter contato com outros pesquisadores. Isso foi muito bom porque tivemos a oportunidade de começar a fazer muitas parcerias e divulgar nossos estudos”, conta.
Em 2009, Gasparini e o cientista da USP Hudson Pinheiro realizaram uma expedição à ilha, coletando mais exemplares do Acyrtus. O estudo genético foi importante nessa etapa do estudo, sendo o ponto chave para confirmar a descoberta da espécie. “A genética veio como uma ferramenta essencial para auxiliar na descoberta do Acyrtus e de outras espécies, descrevendo a parte molecular e identificando os parentescos”.
Apesar do auxílio tecnológico do campo genético na descoberta, os pesquisadores optaram por utilizar a taxonomia tradicional (método que caracteriza as espécies externamente) como metodologia ao descrevê-la. Para justificar a escolha, Gasparini explica que a conservação está sempre de mãos dadas com a taxonomia, sendo um estudo preciso que viabiliza a descoberta de novas espécies, apesar do descaso ambiental tão presente. “Nós só conseguimos estudar e conservar o que conhecemos. O primeiro passo é descrever as espécies para depois entender a ecologia, biogeografia e conservação de cada uma delas”, frisa o pesquisador.
Complexo insular
Responsabilidade da Marinha do Brasil, o complexo insular oceânico formado pela Ilha da Trindade e o Arquipélago Martin Vaz é constituído por ilhas e ilhotas íngremes e de difícil acesso. Elas são os únicos pontos emersos de uma cadeia de montanhas submersas: a Cadeia Vitória-Trindade. Localizada no meio do Atlântico Sul ocidental, a região se encontra a 1.200 km da costa brasileira.
Justamente por esse afastamento do litoral, Gasparini afirma que muitos pesquisadores possuem interesse nessas regiões pela presença dos peixes recifais, como o Acyrtus. “A fauna, assim como a flora de Trindade, desperta um interesse extremo nos pesquisadores devido ao isolamento geográfico, que propiciou a evolução de espécies únicas, endêmicas, neste pequeno ponto imerso no meio do Atlântico”, conta o pesquisador.
Para dar continuidade aos estudos na região, o especialista defende a formação de novos pesquisadores, a disponibilização de mais de bolsas de incentivo à pesquisa e a criação de políticas que sustentem a manutenção desses estudos. “Trindade é um universo, uma vida só não é o suficiente para estudar esse lugar. É muito importante passar o bastão para a nova geração, ensiná-los a ter um olhar crítico, a criar e cuidar de coleções científicas que lastreiam os estudos da biodiversidade e ter os recursos necessários para que isso aconteça”, explica o biólogo.
O pesquisador também ressalta a importância de preservar as ilhas oceânicas, ambientes únicos, com climas e características singulares. Ele afirma que, apesar do afastamento da costa, essas regiões não estão livres de sofrer consequências da degradação ambiental. “A sustentabilidade do planeta depende de educação ambiental e das ações que tomamos. Não é possível preservar a natureza tendo um crescimento populacional desordenado como o que temos. A superpopulação traz diversos problemas que estão destruindo o planeta. Logicamente, as consequências põem em risco até mesmo esses locais isolados e importantes que possuem espécies únicas”, conclui.
* Bolsista em projeto de Comunicação
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