Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência: realidade é de avanços e desafios para as cientistas

Pesquisadora e servidora Cristina Sad
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Sueli de Freitas

A equidade de gênero na produção científica é o foco do Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, comemorado em 11 de fevereiro desde o ano de 2016. A data foi aprovada na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) no final de 2015, para dar visibilidade às contribuições das mulheres no campo da pesquisa e desenvolvimento científico, com o objetivo de despertar o debate para a necessária igualdade de gênero na ciência.

De acordo com o relatório da Elsevier-Bori Em direção à equidade de gênero na pesquisa no Brasil, lançado em março de 2024, a participação de mulheres na ciência como autoras de publicações científicas no país cresceu 29% nos últimos 20 anos. Em 2002, eram 38%; subiu para 49%, em 2022.

Professora Jussara Coelho, do campus de Alegre

Na Ufes, dos 1.879 docentes ativos na graduação e na pós-graduação (incluindo efetivos, substitutos e visitantes), 899 são do sexo feminino (47,84%), segundo dados da Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas. A Universidade tem ainda estudantes de graduação e pós-graduação e servidoras técnico-administrativas que desenvolvem relevantes pesquisas nas mais diversas áreas de conhecimento, como é o caso da doutora em Química e servidora da Ufes Cristina Sad, que integra o grupo do Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento de Metodologias para Análise de Petróleos (LabPetro), responsável por várias patentes registradas pela Ufes no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).

Iniciativas

Algumas iniciativas têm sido adotadas na Universidade visando a uma maior participação feminina na produção científica. Uma delas é o sistema de pontuação das mães nos editais de Iniciação Científica. A nota do currículo dos candidatos e candidatas a orientadores é calculada a partir da média da produção dos últimos cinco anos. Para aquelas que tiveram licença-maternidade nesse período, o cálculo é feito de forma diferente: a soma da produção dos últimos cinco anos é dividida por quatro, no caso de um filho, ou por três, no caso de dois filhos.

Outra iniciativa é o incentivo à participação das mulheres nos editais Mulheres na Ciência, da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes). Nas duas edições do edital (em 2021 e em 2023), as cientistas da Ufes tiveram resultados positivos. Em 2022, captaram 61% dos recursos destinados às pesquisas. Em 2023, foram 94 projetos aprovados.

Professora Jussara e a aluna Laura Candido no III CBPC

“A gente vem conquistando muito espaço na produção científica. Temos tido oportunidade de fazer pesquisas de relevância, mas ainda há muito caminho a percorrer. Precisamos conquistar mais espaço para mostrar que somos capazes. Os entraves para isso ocorrer são ainda o preconceito e a cultura machista. Isso vem melhorando, mas precisa evoluir muito mais”, afirma a professora do Departamento de Engenharia de Alimentos Jussara Coelho.

Ela é uma das pesquisadoras contempladas no edital Mulheres na Ciência. O seu projeto está testando o uso de melatonina para a conservação de mamão. “Em temperatura ambiente, o mamão vai apodrecer rapidamente. Mas se você o mergulha numa solução contendo melatonina, é possível ampliar sua vida útil, conservando seus componentes e preservando suas características por mais tempo”, conta ela.

A pesquisa ainda está em andamento, em fase de testes, mas o projeto foi selecionado entre os 30 melhores no III Congresso Brasileiro de Processamento Mínimo e Pós-Colheita de Frutas, Flores e Hortaliças (CBPC). A professora destaca a relevância do estudo: “O Espírito Santo é o maior produtor de mamão do Brasil, sendo nosso país um grande exportador da fruta. Estudos que visam ampliar a conservação do mamão são muito promissores”, afirmou.

Voto de congratulação

Professora Débora Meira

Outra professora da Ufes que tem se destacado na produção científica é Débora Meira, que atua no no Núcleo de Genética Humana e Molecular (NGHM) do Departamento de Ciências Biológicas (DCBio) e no Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia (PPGBiotec). Ela e seu colega Iuri Drummond foram agraciados na última semana com votos de congratulação na Assembleia Legislativa do Espírito Santo por uma pesquisa que revelou a associação entre a exposição a agrotóxicos e o aumento de doenças como hipertensão, problemas cardiovasculares, renais e neurológicos entre os agricultores do Estado.

“Eu acredito que nós, mulheres, já conseguimos conquistar muita coisa: nosso espaço, demonstrar nossa competência e nossa capacidade em pesquisa, ensino e extensão, mas precisamos avançar mais. Acredito que é necessária mais presença feminina nos cargos de liderança na universidade e nas agências de fomento. Além disso, precisamos de mais editais direcionados às mulheres, que agregam muitas funções e responsabilidades, sendo o tempo para se dedicar à pesquisa reduzido – e esse tempo tem que ser otimizado ao máximo”, opinou a professora.

Nesse momento, Meira integra a coordenação de um projeto que visa explorar o potencial terapêutico de plantas medicinais da Reserva Natural Vale, localizada no norte do Espírito Santo, para o desenvolvimento de novos fármacos para o tratamento do câncer de mama, um dos tipos mais agressivos da doença. “O câncer de mama é provavelmente o mais temido pelas mulheres devido à alta frequência e principalmente pelos seus efeitos psicológicos, que afetam a percepção da sexualidade e da própria imagem pessoal”, lembra ela. O projeto será desenvolvido por pesquisadores do NGHM numa parceria com a empresa Vale.

Aplicativo para mulheres

Professora Rosely Pires

Referência no campo da luta contra a violência doméstica e por direitos humanos, a professora do Departamento de Ginástica da Ufes Rosely Pires foi uma das cinco mulheres brasileiras agraciadas com o diploma Mulher-Cidadã Carlota Pereira de Queirós 2024. A premiação, entregue pela Câmara Federal, reconhece as personalidades cujos trabalhos ou ações tenham se destacado por sua contribuição para o pleno exercício da cidadania, para a defesa dos direitos da mulher e para a promoção da igualdade de gênero no Brasil.

Pires é coordenadora geral do programa de extensão e pesquisa Fordan: cultura no enfrentamento às violências, voltado para a problematização de violências contra pessoas vulneráveis em temas que envolvem principalmente feminicídio, racismo e LGBTQIfobia. O projeto lançou em 2023 o aplicativo gratuito Fordan/Ufes para denúncias das violências contra mulheres.

A tecnologia foi produzida por uma equipe multidisciplinar que reuniu pesquisadores, comunidade e estudantes da Ufes de diversas áreas, como Direito, Comunicação, Tecnologia, Saúde, Psicossocial, Educação e Cultura. Também contou com a participação de 57 mulheres acolhidas pelo Fordan e seus familiares. O projeto do aplicativo foi um dos contemplados no edital Mulheres na Ciência e passará a funcionar em todo o Espírito Santo.

Na avaliação da professora, “nós estamos vivendo um momento importante para a mulher na ciência, o que é uma combinação de políticas públicas, de uma mudança cultural, um esforço para combater o patriarcado e também conseguir investimento privado. Então, nós temos as agências de fomento, como a Capes, a Fapes e o CNPq, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação em parceria com o Ministério das Mulheres – todo esse conjunto tem permitido que as mulheres recebam financiamento, como é o caso do Fordan. A partir disso, desejamos implementar projetos de mudança na sociedade como um todo”.

Por outro lado, diz a professora, ainda há muitas dificuldades que são relacionadas a processos de misoginia, por isso a importância de existirem programas direcionados às mulheres. “Imagine se nós, mulheres, tivéssemos desde sempre essas oportunidades que estamos tendo, com lideranças em laboratórios, em centros de pesquisa… nós teríamos uma sociedade com muito mais possibilidades”, afirmou.

Imagens cedidas pelas pesquisadoras

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