No Departamento de Línguas e Letras da Ufes, um grupo de pesquisadores, coordenado pela professora Mirtis Caser, desenvolve estudos sobre a literatura de autoria feminina, em diferentes tempos e espaços, e também a respeito da participação das mulheres na produção da teoria, da historiografia e da crítica literária e da recepção de obras literárias por mulheres ao longo da história. Em foco, as escritoras brasileiras e de língua espanhola.
“Nossa equipe trabalha com mulheres de todas as letras. Aliás, esse é o nome do nosso grupo de pesquisa no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). São autoras de gêneros lírico, narrativo e dramático, e sobre a participação das mulheres na produção da teoria, da historiografia e da crítica literária. Nosso principal objetivo é dar mais visibilidade à produção feminina”, explica a professora.
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Atualmente, o grupo pesquisa as brasileiras Adélia Prado e Lygia Fagundes Telles; a autora espanhola do século XIX Emilia Pardo Bazán; e as argentinas Isabel Allende e Luisa Valenzuela. Além das análises da produção de Pardo Bazán, também seus textos estão sendo traduzidos. “Essa autora espanhola era condessa, ensaísta, jornalista, poeta, crítica literária e dramaturga. Ela foi uma precursora a respeito dos direitos das mulheres e viveu em uma Espanha machista e patriarcal. Em seus textos, ela reclamava por melhores condições para as mulheres, e seus principais pontos eram educação e trabalho remunerado. Naquela época, havia os estudos de Sigmund Freud a respeito da histeria e Emilia dizia que os problemas das mulheres estavam relacionados à falta de emprego”, diz a pesquisadora.
Mirtis Caser destaca que as mulheres avançaram em muitas áreas, entre elas a de crítica literária, onde buscam encontrar outros parâmetros para avaliar a produção feminina. E foi por meio de muitas pesquisas, que foi possível revalorizar textos que foram desprezados ao longo da história. “É uma tentativa de encontrar outros parâmetros para julgar a produção feminina, de resgatar os trabalhos que foram desprestigiados no decorrer do tempo pela crítica masculina”, acrescenta e cita como exemplo as receitas culinárias.
Receitas e emoção
A sociedade patriarcal determinou o lugar para homens e mulheres, desprestigiando os valores ligados ao feminino. Entre eles as receitas de pratos culinários. Porém os espaços e textos atravessaram séculos na obscuridade para alcançarem hoje o respeito. A pesquisadora Mirtis Caser destaca o livro “Como Água para Chocolate” (1989), da autora mexicana Laura Esquivel, como um exemplo de obra onde toda a emoção feminina passa a ser valorizada pela crítica, principalmente pelas mulheres que são críticas. Mas ainda há muito a ser reconhecido.
“A famosa expressão ‘coisas de mulher’ dá o tom para que muitos dos afazeres femininos não sejam valorizados. E dentre esses afazeres está a escrita. Infelizmente ainda há pouco interesse na produção das autoras. No Espírito Santo, por exemplo, as escritoras da Academia Feminina Espírito-Santense de Letras não têm muito reconhecimento”, denuncia Mirtis Caser.
“As mulheres autoras têm resistido estética e eticamente”, diz a professora Mirtis Caser
“Na literatura há a tentativa de fazer a passagem da coragem de falar, de reclamar e de termos o cuidado de não sermos ‘coitadinhas’. Claro que existem as autoras que escrevem para o mercado e às vezes mantêm o que está imposto. As coisas acontecem muito em ondas, elas são cíclicas. Temos períodos em que houve alteração, que o trabalho das mulheres foi levado a sério e depois temos novamente as quedas. Os períodos de fascismo, de ditadura, são sempre um declínio na situação em que a mulher se encontra. Por outro lado, esses momentos resultam produções em forma de resistência. Acho que essa é uma das grandes questões na literatura feminina: a resistência. As mulheres autoras têm resistido estética e eticamente”, complementa.
Já no que diz respeito às leitoras, a pesquisadora Mirtis Caser frisa: “Temos que ler! Quando uma leitora tem em mãos um texto de autoria feminina, poderá encontrar situações que viveu e que não teve respostas naquela hora e poderá deparar com uma solução que não seja patriarcal. Vale a pena ler a produção feminina e a produção do nosso Estado”.
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