– Por Mikaella Mozer* –
Com mais de 50 milhões de pessoas atendidas no país, a primeira parcela do auxílio emergencial alcançou grupos que estão fora dos programas sociais governamentais e representam 41% dos beneficiados. O que levou às milhares de solicitações de auxílio foram as mudanças decorrentes da reforma trabalhista que deixaram as relações laborais mais precárias. Esses são os pontos de destaque da pesquisa Auxílio emergencial e pobreza no estado do Espírito Santo/Brasil, do grupo Primeira Infância, do Programa de Pós-Graduação em Política Social (PPGPS) da Ufes, que integra o Projeto de Internacionalização da Ufes (PrInt), com a participação de pesquisadores de outros países.
O estudo mostrou uma falha na operacionalização para o pagamento do auxílio, pois, em vez de incluir quem não estava cadastrado em programas sociais, o método adotado, por meio do aplicativo Caixa Tem, voltará a invisibilizar essas pessoas que são justamente aquelas com maior necessidade, classificadas nos grupos de pobreza e extrema pobreza. Com o fim das parcelas, esses indivíduos não estarão cadastrados em nenhum dos sistemas de assistência social.
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A distribuição dos recursos também foi afetada por essa forma de operacionalização. Enquanto os programas sociais conseguem atingir seu público-alvo, o uso do aplicativo Caixa Tem para o auxílio emergencial não proporcionou o mesmo resultado. De acordo com Rodrigo Borges, pesquisador pós-doutorando do PPGPS, isso se deve à falta de verificação mais detalhada dos cadastros dos usuários, o que levou a inadequações, como pagamento do benefício a servidores públicos e pessoas das classes A e B.
A região com maior volume de recursos repassados e de beneficiados, em termos relativos, foi o Nordeste. Já em termos absolutos, foi o Sudeste. A presença do Sudeste no topo surpreendeu os pesquisadores, evidenciando a situação econômica do Brasil. “Apesar de ser uma região mais próspera na economia, esse dado mostra o impacto das decisões econômicas que fizeram grande parte dessa população necessitar de ajuda. Uma grande parcela do Sudeste vive de trabalhos informais ou precários”, relata Borges.
Outro destaque foi a taxa de subutilização – que calcula não só o número de pessoas em busca de emprego, mas também aqueles em trabalho parcial, desalento acidental e os que não buscam por acreditar firmemente que não irão achar. Durante a pandemia, ela chegou a 30%. Borges afirma que essa é uma situação de depressão total. “Na pré-pandemia, já estava em 22%, é muito preocupante”, diz. A taxa de subutilização foi o índice utilizado para essa análise por incluir mais indicadores do que a taxa de desemprego.
Reforma trabalhista
A reforma trabalhista modificou diferentes campos do trabalho e, com isso, transformou também a relação do trabalhador com seu meio de ganho financeiro. De acordo com o estudo, a reforma aprofundou a desestruturação laboral no país. O Brasil teve menos de 1 milhão de empregos criados desde a sanção da reforma, em 2017, até o período anterior ao agravamento da crise pela pandemia, sendo a maioria trabalhos precários, como os intermitentes (sem contrato contínuo) e os parciais – juntas, as duas modalidades correspondem a 8% do total de postos de trabalho existentes no fim do primeiro trimestre de 2020 e a 28% do total de vagas criadas desde a aprovação da reforma.
Segundo a pesquisa, o grau de assalariamento no país caiu pela primeira vez, em décadas, a partir de 2020, evidenciando que o fim da problemática do declínio de salários ainda está distante. Esse quadro geral de contínuo desfalque no mercado de trabalho resultou no amplo volume de solicitações de auxílio emergencial.
O estudo mostrou, ainda, aumento das desigualdades no mercado de trabalho durante a pandemia, com prejuízos principalmente para as mulheres não brancas. Foi constatado que o nível de desocupação (que quantifica as pessoas desempregadas em idade de trabalhar) das mulheres negras é de 63%. “Isso mostra que o mercado é ineficiente, uma vez que não aproveita mais da metade da força de trabalho. O tempo em que a pessoa pode trabalhar não volta. Esses números representam o porquê de tantas pessoas necessitarem do auxílio. Há disfunção nesse campo”, comenta Borges.
Os pesquisadores cruzaram dados do Cadastro Único (CADúnico), do Sistema Único de Assistência Social (Suas), do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD-C) e de portais da transparência para obter essas informações.
Em dezembro, foi realizado um debate virtual com o tema “O Auxílio Emergencial no Brasil durante a pandemia por COVID-19″, na página do Facebook do PPGPS (confira aqui).
*Bolsista de Comunicação
Edição: Sueli de Freitas
Excelente estudo que trata de uma situação tão deplorável de falta de trabalho. A reforma trabalhista, teriam dito ,geraria muitos empregos mas o que vemos é justamente o contrário e muitas fábricas (até de produtos farmacêuticos) estão indo embora daqui, levando consigo o emprego de muitos.
Obrigada por traduzir em números nossa realidade tão sofrida. Quem sabe assim a “mão invisível de Guedes desça do delírio em que se meteu
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