Pesquisa internacional produz teste rápido para detectar toxoplasmose

Parceria com Israel busca aumentar a qualidade da carne consumida no país. Foto: myglesias/CC
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– Por Mikaella Mozer* –

O Programa de Pós-Graduação em Doenças Infecciosas (PPGDI) da Ufes está participando da produção de um aparelho de detecção rápida da toxoplasmose em animais  e humanos. O estudo é desenvolvido em parceria com o Departamento de Parasitologia do Kimron Veterinary Institute (KVI) do Ministério da Agricultura e Desenvolvimento Rural de Israel, o Instituto Weizmann de Ciência (IWC) do mesmo país e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

A doença, provocada pelo protozoário Toxoplasma gondii, pode ser transmitida a humanos por meio das fezes de felinos, entre eles os gatos, ou pelo consumo de carnes contaminadas de bovinos, suínos, caprinos ou aves, entre outros animais, de forma crua ou mal passada. Quando a gestante tem ou teve a doença, pode transmiti-la ao bebê e causar complicações ao desenvolvimento da criança, se não houver tratamento adequado. 

A colaboração internacional teve início com a participação da professora do PPGDI Blima Fux, no Congresso Internacional de Parasitologia, sediado IWC, em janeiro de 2018, quando apresentou um estudo sobre toxoplasmose em galinhas das zonas rurais do Espírito Santo. A pesquisa chamou a atenção dos israelenses, que não tinham trabalhos nessa área e em 2020 a professora voltou a Israel para participar de um treinamento como pesquisadora visitante no KVi pelo Programa Institucional de Internacionalização (PrInt) da Ufes, financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), dando início à pesquisa referente ao aparelho de detecção rápida da toxoplasmose.

Segundo a pesquisadora da Ufes, o teste rápido representa mais controle da qualidade dos alimentos em Israel, já que a nação importa a maioria das carnes que consome. No país, de maioria judaica, a carne deve ser Kasher, ou seja, totalmente limpa e adequada aos padrões definidos pela Torá, livro sagrado dos judeus, para o abate e a criação de animais em busca de uma alimentação nutritiva para o corpo e a alma. Apesar de contar com um rigoroso controle da carne, o governo enfrenta dificuldades no combate da toxoplasmose, uma vez que não é perceptível a olho nu.

Na viagem a Israel, Blima Fux foi treinada para usar aparelho de análise de rastreamento de nanopartículas (NTA, sigla em inglês), juntamente com as pesquisadoras Mônica Mazuz, coordenadora do KVI, Nata Regev-Rudzki, do IWC, e Ana Cláudia Torrecilhas, da Unifesp. A máquina codifica e verifica as concentrações das partículas de vesículas extracelulares. 

O objetivo das quatro pesquisadoras, agora, é produzir um teste capaz de detectar a toxoplasmose de forma mais rápida. “No Brasil, temos um NTA na Unifesp e iremos coletar partículas, buscando idealizar um teste de infecção por essa doença, de forma a agilizar o diagnóstico. O cuidado com os animais relacionados a esse parasita terão uma orientação mais ligeira”, detalha a professora da Ufes. 

A cooperação com Israel via Capes-PrInt busca a realização de pesquisas envolvendo universidades de outros países, com intercâmbio de pesquisadores e participação em eventos. Dentro desse estudo sobre a  toxoplasmose, está previsto o envio de alunos a Israel, após a pandemia. “O contato com outros países é de grande contribuição para o conhecimento educacional deles”, avalia Blima Fux.

A colaboração com a pesquisadora Ana Cláudia Torrecilhas rendeu ainda um artigo sobre as vesículas extracelulares produzidas por Acanthamoeba, um microorganismo de vida livre que pode causar lesão ocular. As vesículas extracelulares foram produzidas a partir de cepas de diferentes genótipos e no estudo, que foi publicado em janeiro deste ano na revista norte-americana Frontiers in Cellular and Infection Microbiology, foram feitas comparações considerando a resposta imunomoduladora de cada um. 

Identificação de cepas

Em outra pesquisa, junto com o Departamento de Parasitologia do KVI, busca-se isolar os cistos do parasita causador da toxoplasmose presentes em animais usados como alimento. O objetivo é mapear os tipos de cepas existentes em Israel e seu grau de virulência, para melhorar o processo de criação dos animais de abate e a qualidade das carnes para os consumidores. 

Em parceria com Monica Mazuz, Blima Fux busca identificar os tipos de parasita e  suas variações genéticas mais fatais em animais em Israel, como as recombinantes. Em um primeiro momento, elas escolheram caprinos de diferentes povoados israelenses para aplicar o trabalho sorológico. Os animais passaram por testes de imunofluorescência direta e de ensaio de imunoabsorção enzimática (ELISA, sigla em inglês) para detectar anticorpos específicos. Em seguida, foi feito o exame de proteína C-reativa (PCR) como teste molecular, de forma a avaliar a cepa.

A equipe conseguiu isolar o cisto de um dos animais. “O isolamento é um processo muito difícil, mas já conseguimos em um animal e vamos tentar em outros. A próxima fase é identificar qual o tipo genético do parasita encontrado. O desenvolvimento dessa parte ficou parado por um tempo devido à pandemia, mas já estamos com planos de voltar”, afirma a pesquisadora brasileira.

Também será feita a comparação entre as cepas brasileiras e israelenses para melhor entendimento dos tipos circulantes em cada região. Um estudante de mestrado do PPGDI coletou amostras de sangue de caprinos da Grande Vitória com essa finalidade.

Pesquisas e uso no Brasil

Enquanto em Israel o foco é o melhoramento da carne, no Brasil a questão principal é a saúde pública, já que em nosso país não há um rigor tão grande com as carnes de consumo. A intenção das pesquisadoras é de que aqui seja feito um trabalho epidemiológico para evitar a proliferação de casos e suas consequências, levando à população o conhecimento sobre a criação de animais e sobre a preparação correta da carne.

Um dos locais onde será feito esse trabalho é o município de Venda Nova do Imigrante, na serra capixaba, que conta com grande presença da toxoplasmose. Um estudo anterior da Ufes verificou uma associação entre a doença e a lesão ocular nessa localidade. Um outro, realizado em 2016 e publicado na Revista de Parasitologia Veterinária, identificou a recombinação de cepas (no Brasil existem os tipos I, II e III) do Toxoplasma Gondii em galinhas caipiras. 

“A toxoplasmose  é um problema de saúde pública que  atinge a população mundial. No Espírito Santo não é diferente, mas precisamos de um trabalho de campo para melhor entendimento de como está a distribuição. Ainda temos poucos estudos aqui no estado”, analisa Blima Fux. A doença ainda pode afetar economicamente os criadores de animais, por poder causar a morte de algumas espécies.

* Bolsista em projeto de Comunicação

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