Novo equipamento permite ampliação de pesquisas sobre fontes de energia limpa

Laboratório de Plasma Térmico (LPT) do Departamento de Física (DFis) do Centro de Ciências Exatas (CCE) da Ufes. Foto: Luiz Vital/Ufes
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– Por Luiz Vital –

Em tempos de acentuada crise energética no Brasil, pesquisadores do Laboratório de Plasma Térmico (LPT) do Departamento de Física (DFis) do Centro de Ciências Exatas (CCE) da Ufes buscam soluções científicas inovadoras a fim de desenvolver novas fontes de energia limpa. Os estudos sobre a fusão termonuclear controlada de plasma foram intensificados este ano com a chegada do equipamento denominado Tokamak. O principal objetivo dessa área de estudo é a geração artificial de plasma por meio de fusão nuclear, que resulta na produção de energia renovável.

A máquina instalada na Ufes é uma câmara de vácuo para confinamento de plasma por campos magnéticos. No seu reator, o plasma é gerado e mantido confinado pela ionização de átomos de hidrogênio, que ocorre por colisões de elétrons superaquecidos em temperatura que pode chegar a 50 milhões de graus Celsius.

Professor Alfredo Gonçalves Cunha opera o Tokamak, equipamento que possibilita a geração artificial de plasma por meio de fusão nuclear. Foto: Luiz Vital/Ufes

Somente a Ufes e a Universidade de São Paulo (USP) possuem esse tipo de máquina em funcionamento no hemisfério sul. O Tokamak-Nova do projeto de pesquisa da Ufes chegou ao campus de Goiabeiras em novembro de 2020. Com peso de 10 toneladas, incluindo o reator e seus componentes como bancos de capacitores, fontes, espectrômetros e sistemas de coleta de dados, a máquina ocupa uma sala de 40 metros quadrados do LPT, e começou a funcionar em junho deste ano. Com o equipamento ativo, os pesquisadores pretendem desenvolver novos dispositivos para aumentar a temperatura do plasma e testá-los no laboratório por meio de experimentos reais.

O movimento seguinte é incorporar esses melhoramentos ao reator TCABR (sigla de Tokamak Chauffage Alfvén Brésilien, em francês) do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP). Para a produção de energia, porém, o Tokamak precisa dispor de dimensões muito maiores como o ITER (sigla de International Thermonuclear Experimental Reactor, em inglês). “O objetivo inicial é ampliar as pesquisas, desenvolver novas tecnologias, dominar a tecnologia de fusão nuclear e formar recursos humanos qualificados para atuação nessa área”, define Alfredo Gonçalves Cunha, professor do DFis/CCE e coordenador do LPT.

Estado de plasma

O estado de plasma é encontrado naturalmente nos raios e na aurora boreal, e é descrito como um gás ionizado, ou seja, um gás cujos átomos estão separados de seus elétrons. A fusão nuclear, por sua vez, é um processo comum na natureza que ocorre no núcleo das estrelas, como o sol, agindo como fonte de energia que mantém a vida na Terra. Os estudos experimentais no LPT buscam desenvolver um injetor de corrente de helicidade que permitirá aumentar a densidade de corrente no Tokamak antes de se iniciar o processo de confinamento magnético e, consequentemente, de temperatura. A presença do Nova na Ufes permitirá medir parâmetros básicos do plasma, como densidade, temperatura e tipos de impurezas para fins de diagnóstico, teste de técnicas e análise de resultados.

O professor Alfredo Cunha avalia que a incorporação desse equipamento ao DFis/CCE da Ufes poderá promover a transformação dos padrões científicos e tecnológicos atuais do Espírito Santo. “O nosso equipamento é muito eficiente, e é pequeno em comparação com os gigantes instalados pelo mundo e que totalizam 67 estruturas”, observa o pesquisador. “O funcionamento da máquina é econômico, avançado, e é possível repetir experimentos quantas vezes sejam necessárias até se alcançar resultados coerentes e conclusivos”, pontua. “A pesquisa brasileira na área de energia por meio da fusão nuclear ainda é precária, enquanto em outros países como Estados Unidos, Coreia, China, Rússia, Índia e na Europa os estudos são estratégicos e bastante avançados”, aponta.

Projeto multidisciplinar

“É elevada a ausência de recursos humanos no Brasil para atuação em fusão a plasma”, assinala o professor Miguel Angelo Schettino Junior, do grupo de pesquisa de materiais carbonosos e cerâmicos do Dfis/CCE e integrante do projeto Nova da Ufes. “Com o equipamento Tokamak-Nova, a Ufes poderá se tornar referência nacional nesta área científica”, acrescenta. A aquisição do equipamento foi viabilizada em 2019 por meio de transferência do Laboratório de Plasma do Instituto de Matemática, Estatística e Física (Imef) da Universidade Federal do Rio Grande (Furg) e concretizada no ano passado. A máquina foi fabricada no Japão no início dos anos 1980 pela Universidade Pública de Shizuoka, e doada na década seguinte ao laboratório do Grupo de Física de Plasmas e Fusão Termonuclear Controlada da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que posteriormente emprestou o equipamento à Furg.

O professor Alfredo Cunha enfatiza que existe carência significativa de investimentos nessa área de pesquisa no Brasil. Segundo ele, isto implica em baixa renovação de pesquisadores, o que leva as instituições de ensino e pesquisa a emprestarem equipamentos como o Tokamak-Nova, que é uma máquina importante, mas que acaba sendo subutilizada se não estiver direcionada permanentemente na formação de novos pesquisadores. “Na Ufes, o projeto busca ter caráter multidisciplinar de estudos, atraindo diferentes áreas do conhecimento como a química, a matemática, a estatística, a informática, a de materiais e as engenharias, em nível de graduação e pós-graduação”, ressalta.

O professor Miguel Schettino acrescenta que os pesquisadores esperam estabelecer parcerias com as áreas de inovação do setor produtivo capixaba e com os órgãos de fomento à ciência e tecnologia, sobretudo para a disponibilização de bolsas de pesquisa.

Radiação zero

De acordo com o professor Alfredo Cunha, o custo de operação do Tokamak não é elevado. Seu combustível é o elemento químico deutério, isótopo classificado como hidrogênio pesado, encontrado na água marinha e com tecnologia já disponível para a sua obtenção a partir do ambiente. À pergunta se a operação do Tokamak-Nova representa riscos à segurança humana por se tratar de processos de fusão nuclear, o professor Miguel Schettino responde que não. “O risco de radiação é zero”, assegura. Segundo ele, a fusão nuclear é uma fonte de energia abundante e muito mais limpa que a da fissão desenvolvida nas usinas nucleares comuns, e seu combustível consiste em isótopos de hidrogênio, como o deutério e o trítio.

Assim, o termo “fusão nuclear controlada” se aplica por estar em contraposição à fissão nuclear, que é a energia gerada pela quebra de um átomo pesado, desenvolvida em reatores em que o urânio é geralmente usado como combustível.

Além do suporte da direção do CCE para a concretização da transferência do Tokamak-Nova para o LPT do Dfis/CCE, os pesquisadores contaram com a intermediação do professor Gustavo Paganini Canal, do Instituto de Física da USP, que é capixaba e egresso do curso de graduação em Física da Ufes.

Canal se tornou parceiro do projeto quando coordenou um coletivo de 40 pesquisadores brasileiros, e convidou o grupo de Plasma do CCE para participar da construção de uma proposta para a elaboração do Programa Nacional de Fusão Nuclear, enviada este ano ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. No LPT, os professores Alfredo e Miguel permanecem trabalhando na montagem do Tokamak-Nova e de todos os seus processos operacionais. Em razão do distanciamento social necessário por conta da pandemia do novo coronavírus, eles pretendem intensificar os projetos de pesquisa assim que forem retomadas as atividades acadêmicas presenciais com segurança.

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