Avaliações sensoriais e químicas ajudam a determinar qualidade do café

Cafés preparados para degustação. Foto: Danieli Debona/ Ufes
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– Por Noélia Lopes* –

Pesquisas desenvolvidas com amostras de café revelam que fatores como o perfil químico do solo, condições edafoclimáticas (que envolvem clima e solo) e os processos pós-colheita influenciam as propriedades químicas do café e, consequentemente, a qualidade final da sua bebida. Os estudos são realizados pelo grupo de pesquisa Coffee Design, formado por professores e estudantes de três instituições de ensino federal, dentre elas a Ufes. O objetivo é atender aos produtores, alavancando a cadeia produtiva do café, e levar informações para os consumidores do mundo todo.

Para conseguir as amostras de café de diferentes tipos, o grupo conta com a parceria de famílias produtoras do Espírito Santo e outras regiões do Brasil. “Não é fácil conseguir uma grande variedade de amostras, então, em contato com o produtor, ele nos auxilia fornecendo a matéria-prima e nós fornecemos os resultados dos estudos, dando um retorno sobre como está a qualidade do seu café”, explica Debona, mestranda em Química. Assim, em média, mais de 80 produtores de café são atendidos em mês de alta safra.

Fazem parte do grupo, dentre outros, os professores vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Química (PPGQUI) da Ufes Marcos Antônio Ribeiro, Paulo Roberto Filgueiras, Lucas Pereira, Emanuele Catarina Oliveira e Eustáquio Vinícius de Castro, coordenador do Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento de Metodologias para Análise de Petróleos (LabPetro), e os estudantes Bárbara Agnoletti, Danieli Debona, Marcos Lyrio e Roberta Frinhani. O grupo também conta com professores do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) de Venda Nova do Imigrante e pesquisadores da Universidade Federal de Viçosa (UFV). 

Ainda segundo Debona, na Ufes as pesquisas com café são realizadas no LabPetro e focadas na parte química do produto. “As amostras chegam ao Ifes campus Venda Nova, onde é realizada a avaliação sensorial, ou seja, o teste de degustação. Provadores treinados e certificados provam o café e fornecem descritores sensoriais e uma nota que classifica o café como especial ou não especial. Depois disso, essas mesmas amostras são direcionadas para o LabPetro/Ufes, onde são realizados alguns ensaios para se obter um mapeamento da composição química do café. Esses resultados são correlacionados com o perfil sensorial da bebida”.

Grupo de Pesquisa Coffee Design. Foto: Danieli Debona/Ufes

Com essa avaliação, é possível diferenciar os tipos de cafés e classificá-los de acordo com as suas características. “Vai ter café com característica de caramelo, chocolate, amêndoa, floral, que são cafés que vão ficar acima de 80 pontos e são considerados produtos especiais. Agora, se o café apresenta notas de amadeirado, vegetal, de sacaria ou papelão, esse café não é especial, ficando abaixo de 80 pontos”, explica Debona.

No LabPetro, os pesquisadores também estudam a composição química do café e do solo. O mestrando em Química Marcos Lyrio relata que os dados sensoriais estão relacionados aos compostos químicos que o produto apresenta. “Durante o processo de torrefação, os compostos químicos do grão cru são degradados e liberam compostos voláteis que dão o aroma da bebida. Os compostos químicos da classe dos furanos conferem atributos sensoriais de caramelo. Há outros compostos, como os da classe das pirazinas, que conferem atributos de nozes, amanteigado ou chocolate, por exemplo”.

Debona, que estuda o processo de torrefação do produto, aponta que o objetivo é identificar o ponto ideal para a torra do grão. “Esse processo é muito complexo e de difícil repetição, então eu estudo o desenvolvimento da torra para identificar o que está sendo formado quimicamente ali. E, a partir disso, faço a correlação dos compostos formados em cada tempo de torra com os atributos sensoriais que os provadores me fornecem”, explica a mestranda.

Grãos de café separados por tempo de torra. Foto: Danieli Debona/Ufes

Na análise da composição química dos cafés, Lyrio também desenvolve um estudo com blends, que são misturas dos cafés do tipo arábica e conilon. “O café conilon é muito comum no Estado do Espírito Santo. Então determinamos seu perfil químico e correlacionamos com o perfil do café arábica. Na aplicação desse método, é possível realizar a autenticidade de misturas (blends) do arábica com o conilon. Utilizando dados químicos obtidos dessa análise, construímos modelos matemáticos para quantificar o teor de conilon em café arábica”, detalha.

A doutoranda e servidora da Ufes Roberta Frinhani trabalha com a caracterização do solo. “Avaliamos a composição do solo, tanto orgânica quanto inorgânica. Procuramos descobrir como isso impacta no produto e como essa informação pode ser relevante para o produtor, que, sabendo da qualidade do solo e dos nutrientes favoráveis, pode ser melhor orientado para adubações e correções a fim de melhorar a fertilidade. A ideia é direcionar o produtor em todos os processos para que ele desenvolva o produto da melhor forma possível”, explica Frinhani.

Consumidor

Além das orientações aos produtores, o grupo de pesquisa Coffee Design realiza apresentações para os consumidores em feiras e cursos de extensão com o objetivo de compartilhar informações sobre os processos envolvidos na obtenção de um café de qualidade. O intuito é promover discussões sobre as práticas de pré e pós-colheita, passando pelo processo de torra, até a extração da bebida. 

Debona afirma que existe uma diferença no café de acordo com o seu método de preparo. “Geralmente, em nossas casas, usamos coador de pano, mas há outros métodos de preparo, como a Prensa Francesa. Esta oferece um café com textura leitosa, mais rico em características aromáticas, já que esse método conserva os óleos essenciais do café. Já o método Hário V60  traz um café mais encorpado, adocicado e com sabor suave. A Chemex resulta em uma bebida mais pura, limpa, suave e levemente ácida. Então, nesses eventos, entre tantas outras coisas que conversamos e ensinamos, passamos também essas informações básicas para que o consumidor perceba, na prática, pequenos detalhes, como a temperatura da água, a espessura do pó e o método de preparo, que vão influenciar no sabor final do café”.

“A maioria das pessoas só conhece aquele café comum de supermercado, torra escura, e desconhece outros tipos. Então vale destacar como o café hoje está deixando de ser visto apenas como uma commodity para se tornar um produto alimentar de valor agregado, um produto especial”, acrescenta Lyrio.

Essa mudança está criando uma nova rotina em muitas cidades do interior, onde hoje é possível encontrar cafeterias de tipos variados em rotas mais conhecidas e turísticas. “Os cafeicultores estão recebendo cada vez mais incentivos e demandas do mercado de cafés especiais. Por isso, é importante que eles busquem formação para se adequar e produzir cafés de qualidade, e é nesse sentido que o nosso grupo Coffee Design atua, auxiliando com informações para que atinjam cafés de excelência”, completa Debona.

Curso sobre café realizado pelo grupo em Cacoal (Rondônia). Foto: Acervo dos pesquisadores

* Bolsista em projeto de Comunicação

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