Ciência Acessível: projetos buscam aproximar a Universidade da sociedade

Modelos celulares tridimensionais criados com massa de biscuit. Foto: Jorge Medina/ Ufes
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Ações de pesquisa e de extensão desenvolvem novas formas de mostrar ao público o conhecimento desenvolvido na Ufes

Por Ana Paula Vieira

“Para muitas pessoas, a ciência é uma utopia, algo distante que pertence a um mundo inacessível e, portanto, inalcançável”. Essa constatação é do professor do Departamento de Morfologia do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Ufes Marco Guimarães, um dos responsáveis por pesquisa que visa justamente aproximar a ciência da população e torná-la acessível a deficientes visuais. Juntamente com sua equipe, o professor desenvolveu modelos tridimensionais de células sanguíneas com o objetivo de levar o conhecimento a estudantes cegos ou com alguma dificuldade visual.

O projeto, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Bioquímica e Farmacologia, foi realizado no Laboratório de Ultraestrutura Celular Carlos Alberto Redins, da Ufes, em colaboração com o Laboratório de Ultraestrutura Celular Hertha Meyer, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O professor Marco explica que os modelos celulares foram criados a partir de imagens reais (bidimensionais) obtidas por microscopia eletrônica de transmissão: “Nós coletamos o sangue, separamos as células e depois processamos esse material, que é desidratado e fixado com produto químico. Isso é o que chamamos de pré-microscopia”. Depois dessa etapa, o material é levado ao microscópio em um bloco de resina, de onde é possível obter uma imagem real da célula, a qual é vetorizada em um computador e levada para impressão em equipamento 3D. As imagens obtidas pelo professor no laboratório da Ufes foram impressas no Instituto Nacional de Tecnologia (INT), por meio de uma parceria com o pesquisador Jorge Lopes.

Professor Marco Guimarães, um dos responsáveis pela pesquisa que visa
aproximar a ciência da população comum e deficiente visual. Foto: Jorge Medina

A ideia de criar os modelos surgiu de observação feita pelo professor Athelson Bittencourt, coordenador do Museu de Ciências da Vida (MCV) da Ufes, que identificou a demanda de atender a estudantes com deficiência visual a partir de peças que eles pudessem tocar. O Museu apresenta cerca de 250 itens que mostram a anatomia do corpo humano –incluindo ossos, espécimes naturais mumificadas, plastinadas ou fixadas em formol –, réplicas de fósseis de hominídeos e de animais pré-históricos e modelos anatômicos didáticos de órgãos e sistemas.

“A visualização de estruturas tridimensionais, por si só, já é um atrativo. Acreditamos que a popularização da ciência ocorra por conta do maior interesse que as pessoas terão em entender como aquilo foi gerado”, afirma Guimarães. A pesquisa também pretende colaborar com a criação de um banco de dados mundial de imagens vetorizadas de modelos celulares. A partir daí, pessoas interessadas poderiam acessá-lo on-line, baixar livremente e produzir os modelos em impressoras 3D para fins educacionais. Essa iniciativa é desenvolvida em parceria com o professor da UFRJ Kildare Miranda, e a expectativa é que o banco fique pronto no final de 2019.

Outra solução para o ensino de Biologia aos deficientes visuais foi desenvolvida pela mestra em Ensino na Educação Básica Andressa Antônio de Oliveira: o biscuit, massa de modelar feita com amido de milho e vinagre, usada no artesanato e também chamada de porcelana fria. Andressa começou a desenvolver a ideia ainda na graduação em Ciências Biológicas, no campus da Ufes de São Mateus, em 2012, quando participou de um projeto de iniciação científica. A orientadora, professora Karina Carvalho Mancini, também incentivou Andressa a integrar o projeto de extensão Biologia Celular na Prática, que desenvolve materiais para o ensino do tema nas escolas, e a continuar a pesquisa no mestrado. O resultado foi a dissertação intitulada “Um olhar sobre o ensino de Ciências e Biologia para alunos deficientes visuais”, defendida em 2018.

Andressa Antônio de Oliveira mostra os modelos usados para o ensino de biologia para alunos com deficiência visual. Foto: Jorge Medina / Ufes

Durante a graduação, Andressa teve a oportunidade de aplicar seus modelos celulares em aulas para um estudante cego na escola Wallace Castello Dutra, em São Mateus. “Eu dava minha aula com o modelo e depois fazia perguntas para avaliar se foi útil para o aluno. Os resultados foram satisfatórios. Após três semanas de trabalho, ele sentiu curiosidade de saber como eram feitos os modelos. Levei a massa de biscuit e o estudante construiu uma célula com riqueza de detalhes”, conta.

No mestrado, Andressa ampliou sua pesquisa e fez um levantamento para identificar os materiais existentes no Brasil voltados ao ensino da Biologia para estudantes com deficiência visual, sejam eles cegos ou com baixa visão. “O resultado mostrou 31 trabalhos e indicou que faltam conteúdos nas áreas de Genética, Evolução e Botânica, que foram meu foco”, explica. Ela cria os modelos priorizando materiais acessíveis e de baixo custo – além do biscuit, usa o isopor. A pesquisadora explica que são representações da realidade, diferente dos modelos desenvolvidos pelo professor Marco Guimarães, que são realísticos. “É um material de fácil acesso. O professor pode fazer a massa de biscuit com materiais que tem em casa”, diz Andressa.

Assim como Guimarães ressaltou, Andressa também acredita que os modelos aproximam os jovens da ciência e facilitam o ensino: “O aluno dito normal tem o livro didático, mas com imagens planas. Elas não atendem aos deficientes visuais, que só ouvem o que o professor fala. Então, os modelos são um material inclusivo, que serve para todos”, destaca a mestra. Ela ressalta ainda que, por serem coloridos, os materiais também favorecem a compreensão de estudantes com baixa visão que, dependendo do nível da deficiência, conseguem compreender o contraste de cores.

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Professor dá dicas de comunicação científica

Extensão

Para fortalecer as ações de divulgação e popularização da ciência, a Pró-Reitoria de Extensão (Proex) da Ufes também tem projetos sobre o assunto e criou, em julho de 2018, um novo setor dedicado a esse trabalho: o Departamento de Inovação e Divulgação da Ciência, sob a coordenação do professor Laercio Ferracioli.

Laercio lembra que a Universidade já tem uma série de iniciativas de divulgação da ciência: “Esses projetos conversam com a sociedade de maneira natural, então a ideia do Departamento é dar uma organicidade às ações, incluindo as áreas de ciências exatas, naturais, da saúde, humanas e sociais”, afirma. O professor também ressalta que a Proex é a pró-reitoria responsável pela interlocução entre a Universidade e a sociedade, e por isso a divulgação deve estar aliada à comunicação: “Temos que estar abertos para receber o questionamento do cidadão e ter essa conversa com ele, visando à produção do conhecimento de maneira geral”, aponta.

Para o coordenador do Departamento, é preciso capacitar a comunidade universitária para dialogar com a sociedade como um todo, e não só com os especialistas da academia. “Preparar um poster, um resumo e apresentar uma pesquisa em um congresso são partes naturais da formação do estudante. Mas o congresso é um restrito clube de pessoas que entendem do assunto. A proposta é ampliar essa conversa”, explica. Por isso, o recém-criado setor oferece oficinas de divulgação científica para alunos de graduação e de pós-graduação e para especialistas. Elas ocorrem sob demanda, e os interessados devem entrar em contato com o Departamento pelo telefone (27) 4009-2330.

Professor Laércio Ferracioli coordena setor da ProEx que trabalha para aumentar a divulgação da ciência. Foto: Jorge Medina/ Ufes

Nesses primeiros meses de trabalho, Laercio enfatiza que o setor está fazendo um levantamento inicial dos projetos de extensão envolvidos com divulgação e comunicação da ciência. Uma das ações realizadas recentemente foi o Pint of Science, festival internacional que ocorreu pela primeira vez no Espírito Santo em maio de 2018. A ideia é levar a divulgação científica para os bares: pesquisadores da Ufes falaram sobre seus estudos em diferentes pontos de Vitória. “Via de regra, esses especialistas estão acostumados a falar com os pares, conversar com um seleto grupo de pessoas que entendem daquele assunto. Com o Pint of Science, a intenção foi preparar esses pesquisadores para divulgar,
desempacotar todo o conhecimento técnico específico, de forma que eles pudessem apresentá-lo para o cidadão comum”, resume Laercio, responsável pelo festival em Vitória.

Ainda em 2018, a Ufes também lançou o Ciência Móvel, um programa que conta com duas unidades móveis – um furgão e uma van – equipadas com kits pedagógicos e adaptadas para transportar cerca de 40 experimentos que podem ser levados para todo o estado, incluindo atividades como exposições interativas, oficinas, minicursos, palestras, observações astronômicas e apresentações multimídias. Outra novidade foi a inauguração do Museu de Ciências da Vida, programa de extensão que ganhou um espaço permanente no campus de Goiabeiras, aberto à visitação. No mês de junho, também foi realizado o I Workshop de Comunicação Científica, com palestras, atividades práticas e competição de comunicação científica. O evento, aberto e gratuito, recebeu 108 inscritos de nove instituições, com formação em ciências da vida, da saúde, humanas, exatas e agrárias.

Van do projeto Ciência Móvel. Foto: Divulgação

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