Metabolismo do Exercício: Parte 3

Respostas metabólicas e integração do metabolismo no exercício físico

A utilização da fosfocreatina tem início assim que se inicia a contração muscular, tamponando o ADP acumulado em virtude da taxa de hidrólise aumentada do ATP. Esse aumento rápido dos níveis de ADP parece ser o estímulo inicial para o aumento da hidrólise da fosfocreatina via reação da creatina quinase. Estudos demonstram que a hidrólise da fosfocreatina é a principal fonte de regeneração de ATP nos primeiros 10 a 15 segundos de exercício de alta intensidade. Entretanto, é importante ressaltar que a glicólise anaeróbica também contribui de forma importante para a geração de energia nesse tipo de exercício, mesmo nos segundos iniciais, apesar de sua contribuição aumentar de forma crescente à medida que a contribuição da fosfocreatina declina. Devido à maior capacidade do sistema fosfagênico de produção de ATP por unidade de tempo (~9 mmol/kg dm-1.s-1) quando comparado ao sistema glicolítico (~4,5 mmol/kg dm-1.s-1), compreende-se a razão por que corredores de curta distância (100 ou 200 m) apresentam maior velocidade nos primeiros segundos da corrida, a qual decai progressivamente até o final da prova.
O músculo esquelético obtém sua demanda metabólica tanto a partir do metabolismo oxidativo quando do anaeróbico. A escolha do combustível depende principalmente da disponibilidade de substrato e oxigênio, mas também da demanda de formação de ATP, que se relaciona com a intensidade do exercício e, conseqüentemente, com o tipo de fibra muscular que é predominantemente recrutada. As fibras musculares do tipo I (oxidativas de contração lenta), recrutadas em exercícios de intensidade mais baixa, possuem alta capacidade oxidativa, apresentando maior capilarização, densidade mitocondrial, conteúdo de mioglobina e atividade de enzimas oxidativas, sendo, dessa forma, mais aptas a utilizar lipídios e carboidratos de forma aeróbica. Em contrapartida, as fibras tipo II (glicolíticas, de contração rápida), que se dividem em IIa e IIb, são mais aptas ao metabolismo anaeróbico, gerando ATP principalmente via fosfocreatina e glicólise anaeróbica.
Dessa forma, observa-se um fenômeno de troca do substrato predominantemente utilizado, à medida que a intensidade do esforço se eleva. Em esforços leves a moderados, os ácidos graxos são substratos preferenciais, enquanto que, em intensidades mais altas, acima de ~65% do VO2 máx, fontes de carboidratos (glicogênio e glicose sangüínea) tornam-se os substratos principais para geração de ATP. A razão para essa troca de substrato predominante parece ser o recrutamento das fibras de contração rápida e o aumento dos níveis de adrenalina. Níveis elevados desse hormônio aumentam a degradação do glicogênio muscular, ao estimular a glicogênio fosforilase, e aumentam a atividade da via glicolítica.
A estimativa da contribuição dos carboidratos e lipídios no metabolismo energético durante o exercício pode ser obtida pela relação entre o débito de dióxido de carbono (VCO2) e o volume de O2 (VO2), que é denominada razão de troca respiratória (ou quociente respiratório – QR). Tal método se baseia no fato de lipídios e carboidratos diferirem quanto à quantidade de O2 utilizado e de CO2 produzido durante a oxidação. Nesse método, exclui-se a pequena participação dos aminoácidos para geração de ATP. Dessa forma, os valores de QR vão de 0,70, em que 100% do substrato utilizado seriam os lipídios, a 1,00, em que 100% do substrato seriam carboidratos. Um valor de QR de 0,85 representa a condição na qual lipídios e carboidratos contribuem igualmente como substratos energéticos.

Sobre Lucas Guimarães Ferreira

Professor do Centro de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Espírito Santo
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