A Política Fiscal do Governo Lula

Lucas de Carvalho Sancho da Silva
(Membro do subgrupo de política fiscal do Grupo de Conjuntura UFES)
Wallace Alves
(Membro do subgrupo de política fiscal do Grupo de Conjuntura UFES)

A Política Fiscal do Governo Lula tem sido palco de grandes disputas internas ao governo, mudanças de direção e, principalmente, fonte de incertezas. Ela teve início já no final de 2022, quando, a fim de cumprir as promessas de campanha, o governo eleito costurou a Proposta de Emenda Constitucional de transição (PEC 32/2022). A PEC tinha como objetivo a garantia de recursos para vários programas sociais que tinham ficado de fora da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2023, como o Bolsa Família de 600 reais e o Farmácia Popular. A PEC da Transição não só abriu margens para esses gastos, como encerrou a Emenda Constitucional (EC) do Teto, que congelava em termos reais as despesas da União por 20 anos. Todavia, esse encerramento foi condicionado à aprovação, ainda em 2023, de uma nova regra fiscal via lei complementar.

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BOLETIM N°.70

Economia Brasileira: Os Limites da Conciliação

Passado um pouco mais de um ano e meio do novo governo, resultados econômicos mais animadores começam a aparecer. Alguma recuperação do crescimento econômico, a redução inflacionária e o aquecimento do mercado de trabalho são os principais indicadores que têm gerado otimismo em relação à condução da política econômica e seus efeitos sobre a vida real. A septuagésima edição do Boletim de Conjuntura em Economia da Ufes discute, justamente, os limites para a manutenção desse ritmo de recuperação dos indicadores econômicos em um governo de conciliação, pressionado por forças conservadoras que insistem em manter as regras da austeridade fiscal.     

      Produzido pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Conjuntura, do curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Espírito Santo, este boletim analisa os indicadores econômicos do ano de 2023 e o acumulado em 2024, indicando que a tentativa de conciliação por parte do governo tem gerado um estreitamento do espaço fiscal e monetário para a indução do crescimento econômico, aspecto que é agravado por um cenário externo bastante instável. O título do boletim, “Economia Brasileira: Os Limites da Conciliação”, reflete os impactos dessa estratégia política sobre a dinâmica econômica. 

               Mantendo a sua tradicional estrutura, o boletim, escrito pelos estudantes, sob coordenação dos professores orientadores e com a contribuição de Fabrício de Oliveira, é composto por quatro seções. A primeira traz a análise do nível de atividade, política fiscal e setor externo; em seguida, uma seção sobre política monetária e inflação, seguida da terceira, que faz a análise do mercado de trabalho. Completando o texto, o economista Fabrício de Oliveira analisa o cenário econômico do ano de 2024.

                  Nós, professores e estudantes do Grupo de Conjuntura, convidamos a todos e a todos para a leitura dos textos produzidos para a presente edição.

Boa Leitura!

Grupo de Conjuntura

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A limitação de gastos na educação frente à armadilha da política fiscal neoliberal

Neide César Vargas¹
João Pedro Santos Froz²
Lucas de Carvalho Sancho da Silva³
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    Os direitos e os mínimos constitucionais na Educação estão sob forte pressão, particularmente desde a aprovação da Emenda Constitucional nº 95 (EC 95/2016), também conhecida como emenda do teto de gastos. O artigo 212 da Constituição de 1988, estabelece que o gasto federal com a educação seja no mínimo 18% da Receita Líquida de Impostos (RLI) arrecadados no ano corrente. Após a aprovação do teto de gastos, o orçamento destinado à educação ficou vinculado à RLI de 2017, corrigida a partir daí pela inflação. Ou seja, nos anos de vigência do teto tais gastos não refletiram o mínimo estipulado pela constituição, e nas previsões efetuadas chegaria a 14,4% da RLI, em 2026, e 11,3%, em 2036. Em suma, a emenda do teto congelava o gasto destinado à educação, tornando o nível de gastos de 2017 o piso da educação no novo regime fiscal.

   Neste cenário, o governo federal reduziu gradativamente a despesa educacional respondendo, em 2016, por 30,3% do total de gastos com educação e, em 2018, 28,1%1 . O Plano Nacional de Educação (PNE), por outro lado, com suas duas dezenas de metas para o decênio 2014/2024, estabeleceu em sua meta 20, que 10% do PIB deveria ser aplicado no setor. Em vez de avançar conforme previa o PNE, o país tem retrocedido no gasto em educação, mantendo o percentual em torno dos mesmos 5% da época de sua criação.

    Após vivenciar o desmonte acentuado do Estado e das políticas sociais nos governos Temer e Bolsonaro, o piso em termos de gastos sociais foi rebaixado, particularmente na educação, sob o discurso de que havia recebido recursos excessivos nos governos petistas. No que se refere ao ensino superior, após o teto de gastos ter sido fixado, houve consequente redução das despesas discricionárias, relacionadas à manutenção e aos investimentos nas universidades e institutos federais, além de coibir reajustes salariais dos servidores, que ficaram sem a reposição de parte relevante de seu poder de compra.

      Eleito Lula para seu terceiro mandato, o esforço do governo foi de garantir ao menos um mínimo de recursos para políticas públicas, muitas delas então abandonadas. Assim, foi costurada a Emenda Constitucional (EC) 126, que ensejou algum espaço para os gastos sociais em 2023, extinguiu o teto de gastos e, ao mesmo tempo, comprometeu-se com a aprovação de uma nova regra fiscal via lei complementar. A mesma emenda terminou por, indiretamente, restabelecer os mínimos constitucionais para a Educação. Dessa forma, em 2023, foi aprovado o Novo arcabouço fiscal (NAF) que se apresenta como um Teto de Gastos um pouco mais flexível, contando que haveria um crescimento significativo das receitas, permitindo algum crescimento real das despesas, sem legislar sobre os gastos educacionais, mas ainda mantendo a lógica da política fiscal de ajuste estrutural.

      O NAF, apesar da flexibilização, no seu segundo ano já enfrenta um problema similar à emenda do teto: o crescimento dos gastos primários2 está limitado a 2,5% de crescimento real ao ano e a 70% da receita, fazendo com que os gastos obrigatórios, dentre eles o mínimo da educação, ocupem parcela cada vez maior do total de gastos primários e pressione todos os demais gastos primários. No caso da educação e da saúde, a restauração da regra constitucional quebra o artifício do teto de gastos e evidencia as razões da nova investida do governo federal no sentido da sua flexibilização e sua resistência em aprovar reajustes salariais para a educação. 

      Para melhor compreender a lógica da política fiscal neoliberal que está por trás do NAF é preciso primeiro descrevê-la. É um dos componentes de uma política econômica peculiar, teorizada pelo Novo Consenso Macroeconômico (NCM), cujo cerne é buscar estabilizar o nível de preços da economia por meio de uma política monetária assentada num regime de metas de inflação e num Banco Central independente. A política fiscal é subordinada à condução da política monetária, sendo voltada apenas para se atingir superávits fiscais a fim de garantir uma trajetória sustentável da dívida pública. Além disso, há a defesa de um regime cambial flutuante, no qual a livre entrada de divisas determinaria o valor comparativo da moeda. Essas três políticas são concretizadas por regras estipuladas dentro do regime legal, a fim de reduzir os graus de liberdade do Estado e, assim, em tese, proporcionar credibilidade ante aos agentes econômicos e garantir segurança e previsibilidade no longo prazo. Nessa perspectiva ortodoxa e dominante de macroeconomia só por essa via se alcança a estabilidade macroeconômica e o crescimento econômico que é puxado pelo aumento do investimento privado e não do Estado.

        No Brasil, a adoção das políticas neoliberais do NCM ocorreu de forma plena em 1999, e teve como desdobramento na política fiscal a introdução de regras fiscais: a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), estabelecida em 2000, a Emenda Constitucional nº 95 (EC 95/2016), ou emenda do teto, e por último o NAF. Dessa forma, é sob essa armadura de regras fiscais, originárias de diretrizes do NCM e expressão do neoliberalismo ao redor do globo, que tem se adotado um ajuste fiscal estrutural no país independente da alternância de poder.

       Deve-se pontuar que tal perfil de política fiscal atende prioritariamente ao compromisso de arcar com as despesas financeiras por meio de excedentes fiscais e, para que assim seja, comprime todos os gastos não financeiros que são exatamente aqueles que são submetidos a tetos. Além disso, exige processos continuados de privatizações e reformas do Estado, os quais reduzem o comprometimento do governo com políticas sociais e com sua atuação direta na promoção do crescimento econômico.

     É importante salientar, que apesar da lógica apresentada, o governo é um lugar de disputa e através da economia política é possível compreender o jogo de interesses por trás da escolha que ele vem fazendo. Primeiramente, Lula foi eleito com pouca margem eleitoral, num país politicamente dividido e polarizado, formando um governo de coalizão. Nesse sentido, um dos seus denominadores comuns tem sido a condução da política econômica em moldes ortodoxos. A política alinhada à sustentabilidade da dívida garante a rentabilidade dos títulos públicos em posse das instituições financeiras. A escolha do governo Lula, portanto, não foi de enfrentamento, seguindo a via típica de conciliação de interesses de classes.

     É possível ver os limites dessa estratégia política e econômica, que claramente não comporta para educação sequer os direitos constitucionais de 1988, sendo, assim, incapaz de satisfazer parcela relevante da base eleitoral do presidente. Alterar esse quadro se contrapõe aos interesses dos grandes oligopólios e do setor rentista da economia, fortemente representado no Congresso, que não toleram incertezas sobre a capacidade do Estado honrar a dívida pública e com isso garantir a sua renda mínima. Além desse aspecto, a armadilha das regras fiscais gera baixa margem para o governo praticar uma política fiscal voltada para a maioria, aprisionando governo, economia e sociedade aos ditames do mercado financeiro.

    Para os trabalhadores da educação, não obstante, este é o momento político de reivindicar e pressionar o governo para manter o compromisso com os gastos em educação acima do mínimo constitucional. Não fazê-lo cobrará um preço alto no futuro. É inadmissível que isso seja feito por um governo que se elegeu com base no voto desses trabalhadores. Ao invés de aprisionar-se a lógica neoliberal da política fiscal praticada pelo governo federal é necessário estabelecer uma divisa civilizatória que o governo deve ser pressionado a não cruzar.

¹ Coordenadora do subgrupo de Política Fiscal do Grupo de Conjuntura e Profª. aposentada do Departamento de Economia-UFES.
² Estudante de Ciências Econômicas/UFES e m
embro do subgrupo de política fiscal do Grupo de Conjuntura UFES.
³ Estudante de Ciências Econômicas/UFES e membro do subgrupo de política fiscal do Grupo de Conjuntura UFES.
 
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EDITAL PROCESSO SELETIVO 2024.1 – RESULTADO

Caros/as estudantes, torna-se público o edital de abertura de inscrições para preenchimento de vagas  no Grupo de Estudos e Pesquisa em Conjuntura Econômica da Universidade Federal do Espírito Santo.

  • DAS VAGAS, EXIGÊNCIAS E SUPLÊNCIA:

As vagas disponíveis estão distribuídas pelos subgrupos, da seguinte forma: :

  • Duas (2) vagas em Empregos & Salários;
  • Duas (2) vagas em Política Monetária e Inflação;
  • Uma (1) vaga em Nível de Atividade & Setor Externo;
  • Duas (2) vagas em Política Fiscal.

BREVE DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DE CADA SUBGRUPO

EMPREGOS & SALÁRIOS
Neste subgrupo, os integrantes estudam a dinâmica do mercado de trabalho brasileiro. Para isso, utilizam dados das principais fontes disponíveis: Pnad-C, RAIS e CAGED.  São analisadas categorias como: informalidade, subutilização, desemprego, com recortes de raça e gênero. Por meio da coleta, organização, análise e interpretação crítica dos dados, torna-se possível compreender o comportamento atual do mercado de trabalho a partir de uma visão estrutural, estudando as suas características, composição e transformações.

POLÍTICA MONETÁRIA & INFLAÇÃO
Os integrantes desse subgrupo estudam e analisam políticas monetárias adotadas pela autoridade monetária do Brasil – o Banco Central – e o comportamento da inflação. Para entender o comportamento da inflação, trabalham com dados do IPCA e INPC, fornecidos pelo IBGE, assim como o IGP-M, fornecido pela FGV. Além disso, também analisam as atas das reuniões do Comitê de Política Monetária, a fim de compreender a conjuntura analisada pelo COPOM para a definição da taxa básica de juros. Outra atividade importante desenvolvida pelo subgrupo é o levantamento e tratamento de dados e tabelas fornecidos pelas Estatísticas Monetárias e de Crédito do Banco Central do Brasil, com o objetivo de compreender melhor as tendências e comportamentos do mercado financeiro e econômico do país.

NÍVEL DE ATIVIDADE & SETOR EXTERNO
Este subgrupo é constituído por dois temas, os quais os alunos podem alternar entre si, caso queiram, e ter a oportunidade de estudar dois âmbitos distintos da economia, mas que estão interligados. Os integrantes do subgrupo desenvolvem a capacidade de extrair e interpretar os dados das bases oficiais para estudar a dinâmica do PIB e o Comércio Exterior, a partir de um olhar crítico. Para isso, os integrantes coletam os dados do IBGE e Banco Central, por exemplo, além de consultar outras fontes para compreender o cenário internacional.

POLÍTICA FISCAL

No subgrupo Política Fiscal, os integrantes analisam o comportamento e a administração das receitas e despesas do Setor Público, ou seja, a maneira como cada âmbito governamental (municipal, estadual, federal), durante o mandato de um governo, gere seus recursos e obrigações. As decisões tomadas são resultado de um processo político, em que interesses conflitantes são colocados frente a frente e influenciam na forma como se constitui a estrutura fiscal de um país. Neste subgrupo direcionamos nossos estudos para áreas como: arrecadação do governo, composição do gasto, dívida pública e teto de gastos.

Vitória/ES, 28 de março de 2024,

A coordenação.

                                        PROCESSO SELETIVO 2024.1 
MATRÍCULASUBGRUPOSITUAÇÃO
2020204429EMPREGOS& SALÁRIOSAPROVADO
2023101117EMPREGOS& SALÁRIOSAPROVADO
2023100709EMPREGOS& SALÁRIOSLISTA DE ESPERA
2023101812EMPREGOS& SALÁRIOSLISTA DE ESPERA
2022200401NÍVEL DE ATIVIDADE, POLÍTICA FISCAL & SETOR EXTERNOAPROVADO
2021101207NÍVEL DE ATIVIDADE, POLÍTICA FISCAL & SETOR EXTERNOAPROVADO
2020203637NÍVEL DE ATIVIDADE, POLÍTICA FISCAL & SETOR EXTERNOLISTA DE ESPERA
2023201680NÍVEL DE ATIVIDADE, POLÍTICA FISCAL & SETOR EXTERNOLISTA DE ESPERA
2021201711POLÍTICA MONETÁRIA & INFLAÇÃOAPROVADO
2021201686POLÍTICA MONETÁRIA & INFLAÇÃOAPROVADO
2020100890POLÍTICA MONETÁRIA & INFLAÇÃOLISTA DE ESPERA
2023100726POLÍTICA MONETÁRIA & INFLAÇÃOLISTA DE ESPERA
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Desvendando a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC)

Atualmente, diversas pesquisas são utilizadas pelo Grupo de Conjuntura para analisar o comportamento da economia brasileira e para sustentar as informações presentes no Boletim. No entanto, apesar de serem um excelente material para compreender a estrutura econômica nacional, não são de amplo conhecimento do público em geral.

Pensando nisso, o estudante Matheus Ferreira Maia, membro do subgrupo Nível de Atividade, elaborou um material explicando, de maneira geral, o que é e como pode ser utilizada a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC). A pesquisa é conduzida pelo IBGE e utilizada para análises referentes ao comércio Nacional.

O objetivo deste material é apresentar a PMC e os seus conceitos ao público, estimulando o estudo e a aplicação dos dados da pesquisa entre estudantes de graduação de Ciências Econômicas e áreas afins.

Boa leitura!!!

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Déficit zero e a Armadilha da Política Fiscal Neoliberal

Neide Cesar Vargas¹ 
Lucas de Carvalho Sancho²

     A discussão sobre o déficit zero remonta às pressões recentes na cúpula do Governo Lula. Por um lado, o ministro da Fazenda Fernando Haddad, comprometido com o Novo Arcabouço Fiscal (NAF). Por outro lado, o ministro da Casa Civil Rui Costa, coordenador do novo Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), defensor do aumento do déficit em 2024, com manifestação pública inicialmente corroborada pelo presidente. Diante da saraivada de críticas da imprensa brasileira, uma reunião no Palácio do Planalto com economistas do círculo presidencial³ convenceu Lula a manter o compromisso com a meta de déficit zero preestabelecida. Todavia, os dados fiscais disponíveis levam o mercado financeiro e seus prepostos junto à imprensa brasileira a desacreditar esse compromisso. Desde a transição de governo, em fins de 2022, o esforço de Lula tem sido o de garantir espaço para gastos sociais e para investimento. Da costura da Emenda Constitucional 126 à posterior aprovação de um novo teto de gastos, a estratégia tem sido a de dar algum espaço aos gastos, mas sem abandonar a lógica de consolidação fiscal. Uma missão quase impossível, pois as necessidades são imensas e a rigidez de gastos ainda permanece significativa.
     A intenção do governo é de fazer uma forte consolidação fiscal baseada no aumento da receita tributária, com déficit primário de 0,5% do PIB em 2023, zero em 2024, superávit primário de 0,5% em 2025 e de 1% em 2026. Ela se assenta numa interpretação que visa a uma redução estrutural da taxa de juros, para gerar crescimento Déficit zero e a armadilha da política fiscal neoliberal econômico puxado principalmente pelo setor privado. Essa é a forma hegemônica de entender a política fiscal na atualidade, que serve aos interesses do mercado financeiro e tem grande parte da imprensa brasileira como sua caixa de ressonância. Dois pilares sustentam tal interpretação. A defesa de que, através da obtenção de superávits primários, haveria aumento da poupança pública e, supostamente, queda da taxa de juros. E a busca de credibilidade na gestão do governo, orientada para manter uma trajetória sustentável para o crescimento da dívida pública e cujo fruto seria induzir o investimento privado e também a redução da taxa de juros. 
     Uma análise da conjuntura de 2023 já indica a dificuldade da estratégia, profundamente dependente do crescimento das receitas tributárias. Neste ano, a expectativa do NAF era que o déficit primário do governo central fosse de 0,5% do PIB, mas o resultado até outubro de 2023 já alcançou 0,71% do PIB. O crescimento das receitas administradas pela Receita Federal foi pífio e a via fácil de gerar superávit fiscal por meio de receitas extraordinárias, interrompida. Tal via, amplamente utilizada por Bolsonaro, resultou no desmonte do Estado, pois se vincula às concessões, privatizações, leilões e antecipação de dividendos. Ao mesmo tempo, o gasto cresceu, principalmente com o Bolsa Família, a suplementação das despesas de custeio com saúde e educação e o parcelamento do pagamento dos precatórios aprovado no governo Bolsonaro.
     O Brasil se inseriu de forma mais orgânica nas reformas e política econômica neoliberais desde o Governo FHC. Mas foi a partir de 1999 que houve uma adesão completa à concepção neoliberal de política econômica, sintetizada no Novo Consenso Macroeconômico (NCM). Segundo ela, a política macroeconômica ótima deve seguir um regime de metas de inflação, visando a controlar o nível de preços através de uma política monetária independente; uma política fiscal subordinada à política monetária, por meio de superávits fiscais e uma trajetória sustentável da dívida pública. Ambas as políticas deveriam ser guiadas por regras legais, reduzindo a discricionariedade do governo e promovendo credibilidade ante os agentes econômicos. O objetivo dessa política é reduzir a atuação do Estado na economia, em tese garantindo segurança e previsibilidade no longo prazo para o aumento do investimento privado, e, portanto, produzir estabilidade macroeconômica. Agregada a uma política cambial flexível, tem sido denominada no Brasil de tripé macroeconômico.  
     No decorrer de 1999 e 2022, diferentes etapas caracterizaram a condução da política fiscal, da construção legal e institucional de um regime fiscal assentado na sustentabilidade financeira da dívida (1999-2002), à ampliação das metas de superávit primário, seguida, a partir de 2007, por certa flexibilização fiscal (2003-2010). Houve o aprofundamento da flexibilização desse regime fiscal acompanhado da deterioração fiscal (2011-2014) e, por fim, forte reversão neoliberal (2015-2022), intensificada no Governo Bolsonaro. 
     Um desdobramento dessa concepção de política fiscal foi a introdução de regras fiscais no Brasil, as quais gradualmente encapsularam a política fiscal numa lógica de Direito Privado e de orçamento familiar, restringindo os graus de liberdade orçamentária do governo, exigindo compressão dos gastos não financeiros e continuada ampliação da carga tributária. 
     A primeira regra fiscal de peso, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), estabelecida em 2000, normatizou os três níveis de governo, bem como os três poderes. Seu impacto foi o enquadramento dos governos no curto prazo visando a um ajuste fiscal continuado. Não houve ruptura, nos governos Lula e Dilma, frente a esse quadro normativo, apenas relativa flexibilização. Com a crise econômica e política de fins de 2014 e a generalização da concessão de desonerações fiscais, o governo federal perdeu espaço político para seguir elevando a carga tributária. Nesse sentido, a Emenda Constitucional nº 95 (EC 95/2016) evidenciou uma mudança qualitativa na gestão orçamentária federal, reorientado para um severo controle de gastos primários, congelados ao longo de vinte anos, corrigidos apenas pela inflação. Essa regra fiscal draconiana visava a ajustar de maneira estrutural e de longo prazo o orçamento público federal, compatibilizando- -o de forma cabal com a noção de sustentabilidade financeira da dívida. Tal medida estreitava a margem de manobra orçamentária federal frente aos ganhos cíclicos de receita, que passariam a ser reservados para o pagamento de juros.
     Somada à Regra de Ouro, existente desde a Constituição de 1988, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Emenda do Teto configuraram uma estrutura jurídica em padrões de ajuste estrito à normatividade neoliberal e em níveis mais restritivos do que o encontrado em outros países do mundo. Ela operava de maneira ainda mais deletéria num contexto de retração econômica, tendo em vista as maiores dificuldades de atender às suas exigências. 
     As regras foram seguidas desde o governo Temer, colocando o orçamento federal em situação de grave estrangulamento, gerando pressão para a reforma da previdência, em 2019, e a continuidade das privatizações. Além disso, trouxe para a pauta a desvinculação das receitas relativas aos gastos com educação e saúde. Em outras palavras, promoveu e ainda promove um enquadramento do orçamento federal à lógica da sustentabilidade, sem espaços relevantes para políticas públicas no campo social e mesmo econômico.
     É sob esta armadura de regras fiscais, tanto herdada de governos anteriores quanto autoimposta pelo próprio Governo Lula, que tem se adotado um ajuste fiscal estrutural independente da alternância de poder.
     É importante salientar que, apesar da lógica apresentada, o governo é um lugar de disputa e através da economia política é possível compreender o jogo de interesses por trás da escolha que ele vem fazendo. Primeiramente, Lula foi eleito com pouca margem eleitoral, num país politicamente dividido e polarizado, formando um governo de coalizão. Nesse sentido, um dos seus denominadores comuns tem sido a condução da política econômica em moldes ortodoxos. A política alinhada à sustentabilidade da dívida garante a rentabilidade dos títulos públicos em posse das instituições financeiras. A escolha do governo, portanto, não foi de enfrentamento, seguindo a via típica de conciliação de interesses de classes.
     Efetivamente, os impactos sobre a economia de não zerar o déficit em 2024 não têm a dimensão que nos faz crer a imprensa, bem como a visão dominante de macroeconomia. Para a sociedade, não fazê-lo resulta em mais espaço para gastos sociais e promotores do crescimento econômico, extremamente necessários para alcançar equidade e o desenvolvimento econômico. A política fiscal neoliberal instaurada desde 1999 não assegura crescimento e renda e muito menos gastos sociais. Intencionando segui-las, o governo fica refém do investimento privado, num contexto como o atual, de taxa nula de crescimento do investimento (FBKF). Alterar esse quadro se contrapõe aos interesses dos grandes oligopólios e do setor rentista da economia, fortemente representado no Congresso, que não toleram incertezas sobre a capacidade do Estado honrar a dívida pública e com isso garantir a sua renda mínima. Além desse aspecto, a armadilha das regras fiscais gera baixa margem para o governo praticar uma política fiscal voltada para a maioria, aprisionando governo, economia e sociedade aos ditames do mercado financeiro⁴.

[1] É coordenadora do subgrupo de Política Fiscal do Grupo de Conjuntura e professora do Departamento de Economia da Ufes. 
[2] É membro do subgrupo de Política Fiscal do Grupo de Conjuntura da Ufes. 
[3]Segundo o Valor Econômico, no dia 7 de novembro ocorreu uma reunião na residência oficial do presidente, com presença de Fernando Haddad, Guido Mantega, Mercadante e Gabriel Galípolo.
[4] O texto foi publicado originalmente na edição número 414 do Jornal dos Economistas. Disponível em: https://www.corecon-rj.org.br/portal/jornal.php?a=2024
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O SETOR DE SERVIÇOS EM 2024: PERSPECTIVAS E DESAFIOS

Kayky Barcelos de Oliveira [1]

    O setor Serviços é, atualmente, o principal componente do PIB pela ótica da produção, compreendendo cerca de 70% do agregado macroeconômico. O setor é de extrema importância para a economia nacional, sendo o motor do crescimento econômico no período em que o país sofre com a desindustrialização. Contudo, apresentando crescimento débil desde o segundo semestre de 2022, o setor terá de superar grandes obstáculos este ano, tais como a falta de incentivos do governo, o alto nível de endividamento das empresas, as elevadas taxas de juros, além do baixo poder de compra dos agentes. Visando manter projeções de crescimento mais otimistas para a economia em 2024, um dos grandes desafios será reacender a dinâmica do setor Serviços.
      A projeção do Banco Central realizada na primeira semana do ano passado traçava crescimento menor do que 1% para o Produto Interno Bruto no ano de 2023, em comparação com 2022. Os principais dados da economia no ano passado revelaram um esforço de recuperação, promovendo o crescimento acima das expectativas dos economistas de mercado. No acumulado do ano de 2023, os dados do terceiro trimestre indicam crescimento de 3,2% do PIB. Apesar disso, o setor de serviços cresceu 2,6%, o que corresponde ao índice mais baixo desde o primeiro trimestre de 2021, sob a mesma base de comparação.
     Algumas das principais promessas de campanha do governo estavam atreladas ao retorno do poder de compra dos agentes econômicos durante os  mandatos Lula I e II. Porém, os projetos governamentais ainda não surtiram os efeitos necessários para consolidar o crescimento do Consumo das Famílias, fato que contribuiria para o movimentar o setor de serviços, pela ótica da produção. De acordo com os dados do Sistema de Contas Nacionais Trimestrais, no acumulado do ano de 2023, até o terceiro trimestre, o crescimento do Consumo das Famílias corresponde a 3,4%, indicando o menor índice para o mesmo período desde 2020. O encarecimento do crédito, em conjunto com a inflação do período, contribuiu para a falência de diversas empresas e para o aumento da inadimplência e do endividamento entre as famílias.
       O setor de serviços, assim, enfrenta diversos problemas financeiros desde 2020, com o início do lockdown, e que foram agravados no intervalo de tempo em que as taxas de juros subiram de 2%, em março de 2021, para 9,25% em dezembro do mesmo ano. O setor tenta se recuperar dos efeitos da pandemia da Covid-19, lidando com enorme endividamento. De acordo com o Observatório Brasileiro de Recuperação Extrajudicial, os pedidos de recuperação perante a justiça saíram de 8, em 2019, para 32 em 2023[2]. Durante o período pandêmico, houve uma retração do consumo, diminuindo as receitas do setor de serviços. 
      Tendo como meta a ampliação desse consumo, a equipe do governo tentou, ao longo do ano passado, retomar as políticas de redistribuição de renda e conceder auxílios assistenciais às famílias, e, assim, possibilitar a dinamização econômica. O objetivo do projeto econômico para 2024 é tentar reaquecer a demanda por bens e serviços no mercado interno e efetivar o crescimento econômico por meio do efeito multiplicador do Consumo do Governo[3]. O programa Desenrola[4], então, surge com o intuito de ampliar a margem para o consumo das famílias, possibilitando que os endividados saiam do vermelho, tenham acesso ao crédito e movimentem a economia como um todo. Pela ótica da demanda, o Consumo das Famílias é o maior componente do PIB, sendo responsável pela movimentação da economia. 
     Entretanto, o Desenrola ainda não atingiu as expectativas, atendendo a um número menor de pessoas do que o esperado em sua criação. Apesar de ser considerado um sucesso, por ter atendido cerca de 11 milhões de brasileiros, o programa ainda precisa de maior adesão para alterar o quadro nacional.  O incentivo ao projeto continuará no primeiro trimestre de 2024 e, além disso, ganhará braços para tentar aliviar as dívidas de empresas e microempresas. Segundo as expectativas do governo, o programa deve auxiliar cerca de 7 milhões de microempreendedores. 
      Vivendo sob grande pressão, o governo tem tentado aumentar a arrecadação fiscal e zerar o déficit primário[5], fato que dificulta o manejo político-econômico para o cumprimento de algumas de suas promessas eleitorais. Em dado momento da campanha eleitoral, a equipe econômica chegou a prometer a isenção gradual do imposto de renda para quem recebesse até 5 mil reais. No primeiro ano do mandato, foi concedida a isenção do IR para quem recebia até dois salários mínimos, o que pôde auxiliar no aumento do orçamento familiar. Entretanto, com o reajuste do salário mínimo acima da inflação, o grupo de pessoas que recebe na faixa de dois salários pode voltar a pagar o tributo. O não cumprimento dessa promessa, até o momento, decorre da exigência de cumprimento das metas fiscais. A arrecadação advinda do imposto de renda é fundamental para as contas públicas, o que dificulta a aplicação da isenção até a faixa dos 5 mil reais de imediato. Para 2024, a equipe econômica afirma que haverá um novo reajuste na tabela do IR, mas os valores ainda não foram revelados.
      O governo tenta conciliar um estímulo ao crescimento da economia, enquanto se esforça para aumentar a arrecadação das contas públicas, visto que segue pressionado para o cumprimento das metas fiscais. Para tanto, entre as medidas tomadas pelo governo, está a designação de novas regras tributárias para produtos importados, o que repercutiu dentro do setor. Na última década, o crescimento do e-commerce possibilitou a ascensão de grandes empresas estrangeiras em solo nacional. De acordo com o Banco Central, o valor das importações de bens de pequeno valor saltou de US$ 800 milhões, em 2013, para cerca de US$ 10 bilhões em 2022. O comércio digital, segundo os empresários, afeta a economia brasileira com a perda de competitividade dos produtos nacionais dentro do território.
   A isenção para importações de até 50 dólares gerou descontentamento entre os representantes da indústria e do comércio nacional. A Confederação Nacional das Indústrias, em conjunto com a Confederação Nacional do Comércio de Bens e Serviços, protestou perante o Supremo Tribunal Federal. Enquanto os empresários lutam por uma suposta “isonomia tributária”, aumentar a carga tributária ou retirar a isenção geraria um desconforto com a base do governo, tendo em mente que pressionaria ainda mais o orçamento familiar. No mais, o governo também não está em condições de retirar totalmente a carga tributária, visto que necessita dessa receita para a arrecadação fiscal.
    Dessa forma, o setor de serviços ainda deve sofrer no ano de 2024 com a falta de incentivos, decorrentes das metas fiscais do governo. As medidas da equipe econômica para aquecer a produção nacional ainda caminham em um ritmo lento. Focado em zerar o déficit primário, o governo tem controlado seus movimentos para tentar reequilibrar as contas públicas, sendo constantemente vigiado pelos economistas de mercado. No momento, as taxas de juros permanecem altas, mesmo que estejam em uma trajetória de cortes desde o fim de 2023. O crédito encarecido dificulta a ampliação da escala produtiva, de novos investimentos na economia e do aumento do consumo. A renda disponível para o Consumo das Famílias ainda é insuficiente para que os setores da economia consigam reverter os efeitos do período pandêmico, refletindo a necessidade de incentivos na base de sustentação da economia brasileira para alterar a trajetória de crescimento. A presença das empresas estrangeiras com o e-commerce também representa um desafio para a economia brasileira, cada vez mais refém dos produtos chineses e estadunidenses.
     Estando atrelado ao bom desempenho dos outros setores da economia, o setor de serviços é extremamente amplo e heterogêneo, refletindo o comportamento macroeconômico e a conjuntura político-econômica nacional. Em uma economia fragilizada, como a brasileira, e que vive um período de desindustrialização e desestatização, o setor de serviços acaba por torna-se o principal fator do crescimento, empregando o maior número de brasileiros e compreendendo a maior fatia do Produto Interno Bruto. Vale ressaltar que o crescimento impulsionado pelo setor de serviços, apesar de necessário, não necessariamente traduz-se em crescimento com desenvolvimento da escala produtiva e geração de empregos de maior remuneração, visto que a mão de obra empregada no setor e a produção, em geral, são de baixo valor agregado. 
       Diante da conjuntura exposta, o ano de 2024 trará desafios, mas o horizonte para o setor é o melhor desde a pandemia, podendo enxergar, finalmente, uma recuperação, ainda que pequena. A atenção da pauta governamental deve, com urgência, ser o retorno da distribuição de renda para as famílias e um esforço para reduzir a carga do endividamento familiar. O aumento do poder de compra da população faz com que a economia local se desenvolva, gerando emprego e renda. O ambiente macroeconômico pode vir a ser favorável para o setor de serviços, porém, é necessária uma certa cautela. Ainda com a situação desfavorável nesse começo de ano, as expectativas para o setor podem ser positivas caso a inflação continue sua trajetória dentro da meta do governo, mantendo, assim, o poder de compra dos agentes e que a taxa básica de juros prossiga em queda, como vem sendo observado, possibilitando a oferta mais barata de crédito.

[1] Graduando em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Espírito Santo e bolsista pelo Programa de Educação Tutorial do curso de Ciências Econômicas da UFES (PET Economia UFES). Além disso, é membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Conjuntura do Departamento de Economia – Subgrupo Nível de Atividade, Política Fiscal e Setor Externo.
[2] A Recuperação Extrajudicial é uma forma jurídica das empresas evitarem o processo de falência. Caso seja concedida, a execução das dívidas entra em stay period.
[3] Segundo a leitura keynesiana, o efeito multiplicador dá-se quando os resultados de um investimento público causam uma variação muito maior do que o esperado inicialmente.
[4] O Desenrola é um programa de renegociação de dívidas que tem por objetivo diminuir o número de inadimplentes no país.
[5] Define-se como o resultado entre as receitas e as despesas do governo, excluindo os juros.
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BOLETIM Nº. 69 | FEVEREIRO 2024

FRAGILIDADES DO CRESCIMENTO BRASILEIRO

Diversas dúvidas pairavam sobre o desempenho da economia brasileira em 2023, devido principalmente ao ambiente político conturbado presente no início do ano.  Em meio às incertezas, o resultado positivo do Produto Interno Bruto (PIB), o principal agregado macroeconômico, gerou um certo otimismo para as perspectivas de crescimento da economia nacional. Além disso, o clima de otimismo foi alicerçado durante o ano pelo arrefecimento do processo inflacionário, pela diminuição da taxa básica de juros e pela supersafra agrícola. No entanto, apesar dessas notícias positivas, existem fatores conjunturais que podem gerar dificuldades para um crescimento duradouro da economia nacional.

É nesse sentido de incertezas sobre as perspectivas de crescimento da economia brasileira que o Boletim de Conjuntura em Economia da Ufes, produzido pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Conjuntura, do curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Espírito Santo, chega em sua sexagésima nona edição. Mantendo sua tradicional estrutura, o boletim, escrito pelos estudantes, sob coordenação dos professores orientadores e com a contribuição de Fabrício de Oliveira, é composto por quatro seções. A primeira traz a análise do nível de atividade, política fiscal e setor externo; em seguida, uma seção sobre política monetária e inflação, seguida da terceira, que faz a análise do mercado de trabalho. Completando o texto, o economista Fabrício de Oliveira faz um balanço dos resultados da política econômica do ano de 2023 e analisa as perspectivas do cenário econômico para o ano de 2024.

O título do boletim, fragilidades do crescimento brasileiro, reflete a vulnerabilidade do crescimento da economia brasileira em 2023, posto que alguns pilares do desempenho econômico brasileiro do ano passado, como a agropecuária, apresentam um desempenho instável ao longo do tempo. Além disso, as análises dos indicadores demonstram a persistência de problemas estruturais que dificultam o dinamismo da economia brasileira como processo de reprimarização da pauta exportadora, desindustrialização e elevação da informalidade. Nós, professores e estudantes do Grupo de Conjuntura, convidamos a todas e todos para a leitura dos textos produzidos para a presente edição,

Boa Leitura!
Grupo de Conjuntura

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Desvendando a Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF)

Atualmente, diversas pesquisas são utilizadas pelo Grupo de Conjuntura para analisar o comportamento da economia brasileira e para sustentar as informações presentes no Boletim. No entanto, apesar de serem um excelente material para compreender a estrutura econômica nacional, não são de amplo conhecimento do público em geral.

Pensando nisso, o estudante Matheus Ferreira Maia, membro do subgrupo Nível de Atividade, elaborou um material explicando, de maneira geral, o que é e como pode ser utilizada a Pesquisa Industrial Mensal- Produção Física (PIM-PF). A pesquisa é conduzida pelo IBGE e utilizada para análises referentes ao setor industrial brasileiro.

O objetivo deste material é apresentar a PIM-PF e os seus conceitos ao público, estimulando o estudo e a aplicação dos dados da pesquisa entre estudantes de graduação de Ciências Econômicas e áreas afins.

Boa leitura!!!

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A Reforma Tributária

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Impostos sobre o consumo: forças e novos caminhos

Luan Antunes*

    O momento é considerado histórico. Foi promulgada a Emenda Constitucional 132, que altera, apenas sob a ótica do consumo, as regras do tão criticado e tumultuado Sistema Tributário Nacional – objeto há décadas de debates, estudos, promessas eleitorais e descrédito da opinião pública e de setores econômicos.
    Com esforços do governo federal e do Congresso Nacional, a sociedade assistiu ao primeiro grande ato de reorganização do arcabouço legal quando o assunto é imposto e regra de arrecadação. O atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, considera que o novo desenho do sistema tributário merece uma nota 7,5, mas com a possibilidade de revisões a cada 4 anos o mesmo poderá ser 10. O sistema que será abandonado seria nota 2 na visão do ministro.
    A PEC substitui os impostos federais PIS, IPI e Cofins pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal, e o estadual ICMS mais o municipal ISS pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência conjunta estados e municípios. Também estabelece a criação de um terceiro novo imposto, o Imposto Seletivo (IS) já apelidado como “imposto do pecado”, pois será uma cobrança federal para desestimular consumos que fazem mal à saúde e ao meio ambiente.
    Há, na troca substancial de modelo de impostos, a primeira grande força do novo regramento. Cartilha em uma centena de países, o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) segue uma lógica que quebra a principal característica do nosso tão afamado modelo atual, a cobrança de imposto sobre imposto, a cumulatividade, a bitributação. O Brasil caminhou para um IVA dual, com a CBS sendo um IVA da União e o IBS um IVA destinado ao caixa de estados e municípios.
    O IVA brasileiro já nasce pelas estimativas com a maior alíquota total do mundo, de até 27,5%. O percentual de parâmetro significa o limite que a soma dos dois impostos sobre determinado item ou serviço pode alcançar. A cobrança máxima já não chegará para setores de uma não-seleta lista de exceções e descontos definidos na própria PEC, um ponto de divergência e crítica por diversos juristas: exceções e favorecidos deveriam ser definidos em leis, de mais fácil revisão.
    O modelo precisou ser dual para a construção de uma padronização nacional de alíquota e a construção de um caminho pelo fim de políticas de incentivos fiscais desencontradas entre os entes da Federação. Para acabar com a guerra fiscal entre estados, a segunda força da EC 132 é a definição de que o recolhimento de qualquer tributo só se dará na UF destino, no local onde ocorrer o consumo do produto ou serviço. Mudança substancial para uma sociedade de tantas entrelinhas quando o assunto é ICMS, por exemplo.
    Sem negar o avanço, o que vem sendo chamado de reforma é, de fato, só o começo dela. O texto aprovado abriu um longo horizonte de negociação política nos próximos anos. Não só pelo fato de Brasília, como um todo, ter escolhido focar primeiro no paiol do consumo e prometido para um futuro as pernas de negociações politicamente mais complexas – a tributação sobre renda e patrimônio –, mas, também pelo fato de que ao constitucionalizar diversas regras importantes, a PEC exige a discussão e criação de leis complementares pesadas.
    Com o novo texto na Constituição, o país deverá regulamentar nos próximos anos, por exemplo, parâmetros de alíquotas, os fundos especiais e de compensação, a definição dos itens da cesta básica e até mesmo o funcionamento do próprio Conselho Federativo que fará a gestão do imposto que compete a estados e municípios, objeto de muitos questionamentos e mensagens de descrença.
    Com longa transição federativa (2029 a 2079), o texto constitucional da reforma do consumo traz expectativas econômicas de médio prazo. Sem garantia de que serviços e produtos ficarão mais baratos, mas com as promessas de fim da guerra fiscal e manutenção da carga tributária, sob o modelo IVA, projeta-se mais simplicidade, mais confiança de investidores dos principais setores, mais crescimento econômico e geração de emprego – mesmo mantra de tudo o que se chamou de reforma nos últimos anos em nível nacional.
    Em outros termos, para além da possibilidade de prevalecer realmente uma vontade política de pautar num futuro próximo e mudar as regras de impostos sobre renda – perna que mais escancara o problema da regressividade e da desigualdade tributária–, a caixa de ressonância de diversos interesses setoriais, o Congresso Nacional, só começou no tema consumo um importante caminho, mas que não pode ser vendido ou entendido como pauta única, como já percorrido. As forças da reforma consideradas positivas pelo mercado, academia e o mundo político dependem de muita regulamentação e espírito republicano na construção dos próximos textos legais.

*Recém-formado em Ciências Econômicas pela UFES e membro do subgrupo de Política Fiscal do Grupo de Conjuntura.

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