Digressões sobre o Estatuto e Regimento da UFES

Página da Atualização do Estatuto e Regimento da UFES:

Sobre as Finalidades e Princípios de Eficiência

Penso que o estatuto e regimento da Universidade devem estabelecer condições ideais para o desenvolvimento das suas atividades fundamentais: ensino, pesquisa e extensão. Para tanto, acredito na necessidade do estatuto incorporar os seguinte princípios:

  • Princípio dos Mínimos Encargos Administrativos: os docentes e discentes devem ser poupados de obrigações administrativas tanto quanto possível;
  • Principio da Máxima Autonomia e Responsabilidade: os docentes e discentes devem assumir tanto autonomia quanto responsabilidade pelo seu desenvolvimento/rendimento acadêmico.
    Este princípio pode ser implementado em três vias:

    • pela flexibilização dos currículos e das formas de condução das disciplinas;
    • pela valorização das ações e dos agentes que produzam melhores resultados acadêmicos (segundo critérios que subentendam a ética, a liberdade intelectual e o aprimoramento sócio-cultural);
    • os servidores técnico-administrativos devem participar mais ampla e efetivamente do planejamento e execução das tarefas administrativas, podendo assumir posições de chefia em órgãos colegiados em função da competência profissional e do reconhecimento pelos pares.

Considero inadequada qualquer proposta de estatuto ou regimento que não ataque os principais problemas vivenciados pela comunidade acadêmica, especialmente por estudantes e professores, dentre os quais:

  1.  uma estrutura organização e divisão de trabalho do corpo de servidores que acarreta o acúmulo de responsabilidades administrativas pelos docentes, que acabam por obstruir sua dedicação ao ensino, pesquisa e extensão;
  2. a persistência de um modelo de ensino, aprendizagem e avaliação na graduação que têm se mostrado ineficiente quanto aos resultados e  inadequado à conjuntura tecnológica e científica atuais.

Não creio que seja essencial a questão da Universidade possuir ou não departamentos para aglutinar professores. Este é um aspecto administrativo que pode ser bem resolvido de um jeito ou de outro, dependendo dos detalhes. Entretanto, acredito na importância dos departamentos para aquelas áreas que contribuem para diversos cursos, posto que neles os docentes podem mais naturalmente discutir e prover soluções para as questões que requeiram seu expertise e colaboração. Aqui, penso especialmente nas áreas básicas das ciências exatas e humanas – matemática, física e química, mas também filosofia e ciências sociais, por exemplo. Especificamente, proponho as seguintes sugestões para a caracterização, organização e administração dos departamentos:

  1. os departamentos devem ser unidades administrativas e deliberativas constituídos por professores e técnicos-administrativos;
  2. os professores devem possuir as atribuições de lecionar nas disciplinas dos cursos de graduação e pós-graduação; desenvolver projetos de ensino, pesquisa e extensão; colaborar na administração do seu departamento e da Universidade;
  3.  os professores devem decidir sobre questões didáticas relativas às disciplinas nas quais seus professores atuam, colaborando com os colegiados de curso na elaboração e atualização curricular (incluindo ementas e programas de disciplinas);
  4. as câmaras departamentais podem ter número flexível de integrantes, variando de 25% a 100% do número de docentes e com a seguinte composição mínima: chefe, subchefe, representante docente para questões de ensino, representante docente para questões de pesquisa, representante docente para questões de extensão; (Naturalmente, a composição das câmaras departamentais e algumas questões fundamentais devem ser deliberados por todos os membros do departamento – incluindo nessas questões, os critérios para distribuição/atribuição de encargos.)
  5. técnicos-administrativos dos departamentos podem ocupar  o cargo de chefia (após passar por um processo seletivo e ser eleito pelos membros do departamento); (A universidade pode criar um “curso para chefias” e exigir aprovação nesse curso para aqueles técnicos que quiserem assumir esta função.)

Algo parecido pode ser pensado para os colegiados, também permitindo que técnicos-administrativos sejam coordenadores de curso.

As ideias esboçadas acima naturalmente requerem detalhamentos para que possam ser incorporadas no estatuto ou regimento da Universidade, mas já apontam caminhos para uma “desoneração da carga administrativa” dos docentes.

Uma questão delicada diz respeito às prerrogativas de colegiados e departamentos na administração dos cursos de graduação. Em síntese, essas prerrogativas precisam contribuir para que as especificidades dos cursos sejam consideradas mais sensivelmente pelos departamentos, bem como as especificidades da área de atuação de um departamento sejam levadas em conta pelos colegiados dos cursos. Os cursos são um ponto de encontro entre colegiados e departamentos que têm gerado atrito na estrutura organizacional da Universidade, gerando dificuldades administrativas. A extinção dos departamentos é uma solução possível para esse problema, mas ao custo de gerar outras dificuldades –  dentre as quais está uma possível disseminação de disciplinas básicas específicas e inequivalentes – o que provavelmente demandará maior encargos didáticos para os professores. (Por exemplo, imagine uma disciplina de cálculo específica para o curso de administração, outra para o curso de economia, outra para o curso de física, outra para o curso de química, outra para o curso de matemática, etc. Além desse fenômeno aumentar o número de professores necessário para atender a oferta separada dessas disciplinas, ele vai contra a ideia de flexibilizar currículos – pois tal flexibilização pressupõe maior quantidade de disciplinas eletivas que possam ser aproveitadas por diversos cursos – e essas disciplinas podem ser tanto mais abrangentes quanto mais básicas forem.)

Finalmente, acho que a Universidade pode melhorar bastante os procedimentos relativos à progressão funcional dos professores. Atualmente, a progressão funcional é regulamentada na Universidade por resolução específica, mas poderia ter seus princípios gerais incorporados no estatuto ou regimento, tais como os seguintes:

  1.   definir uma unidade específica do setor de recursos humanos para cuidar de todos os processos de progressão funcional dos docentes;
  2. informatizar completamente e automatizar tanto quanto possível o registro das informações docentes e tramitação do processo de progressão;
  3. estabelecer que as progressões horizontais sejam automáticas, desde que sejam atendidos critérios mínimos de desempenho profissional e acadêmico;
  4. estabelecer que as progressões verticais exijam dos docentes tanto capacitação quanto produção acadêmica compatíveis com as metas institucionais de eficiência e produtividade. (Os critérios para progressão devem privilegiar largamente as atividades de ensino, pesquisa e extensão sobre as atividades administrativas).

Quanto à proposta da Comissão Especial da Universidade montada para tratar dessas questões, me parece que não avança muito nas ideias esboçadas aqui.

Sobre as Avaliações em Disciplinas de Graduação

O Estatuto atual no Art.75 e a Proposta de Estatuto no Art.91 declaram identicamente:

  • “O Regimento Geral da Universidade disciplinará as condições de ingresso nos diferentes cursos, o regime de estudos e a avaliação do aproveitamento, as áreas de habilitação acadêmica ou profissional e os demais aspectos relativos ao ensino, observadas às normas da legislação em vigor.”

O atual Regimento Geral da UFES estabelece:

  • “Art.104. A aprovação em qualquer disciplina somente será concedida ao aluno que, satisfeitas as demais exigências, obtiver um mínimo de ¾ (três quartos) ou 75% de freqüência às aulas dadas nessa disciplina.”
  • “Art.108. Será exigido um mínimo de 2 (dois) trabalhos escolares por período letivo em cada disciplina.”
  • “Art. 109. Ressalvada a hipótese contida no Parágrafo Único deste artigo, além dos trabalhos escolares previstos no artigo anterior, haverá, no fim do período letivo, em cada disciplina, uma verificação final, abrangendo o programa lecionado.
    Parágrafo único. Ficarão dispensados da referida verificação final apenas os alunos que obtiverem média igual ou superior a 7 (sete) nos mencionados trabalhos.
  • “Art. 113. As notas atribuídas, na avaliação dos trabalhos escolares e na prova prevista no art. 105 deste Regimento, serão expressas em valores numéricos, variando de zero a dez.”
  • “Art. 115. Será considerado aprovado, podendo obter os créditos oferecidos pela disciplina no período letivo, o aluno que, satisfeitas as exigências da freqüência, obtiver crédito – nota igual ou superior a 5 (cinco), no caso dos cursos de graduação, e igual ou superior a 6 (seis), no caso dos cursos de pós-graduação.”
  • “Art.116. Será considerado inabilitado o aluno que:
    I. Obtiver crédito-nota inferior a 5 (cinco) nas disciplinas dos cursos de graduação, e inferior a 6 (seis) nas disciplinas dos cursos de pós-graduação;
    II. Comparecer a menos de 75% das atividades escolares.”

Proponho as seguintes atualizações para o Regimento Geral:

Proposta para o novo Regimento Geral da UFES:

  • Art.X. Em cada disciplina, o aluno deve ser submetido a pelo menos duas avaliações regulares, com notas atribuídas numa escala de zero a dez, realizadas durante o período letivo.
    Parágrafo Único: Denomina-se Nota Regular (NR) do aluno numa disciplina a média entre suas avaliações regulares.
  • Art.Y. Caso o aluno obtenha Nota Regular (NR) entre 3 e 6 (inclusive), ele deve ter a oportunidade de realizar uma avaliação complementar, com nota atribuída numa escala de zero a dez denominada Nota Complementar (NC), após o término do período letivo.
  • Art.Z. A Nota Final de um aluno numa disciplina é calculada do seguinte modo:
    I. Será igual a Nota Regular, caso esta seja maior ou igual a 6;
    II. Será a média aritmética entre a Nota Regular e a Nota Complementar;
  • Art.Z. Para um aluno ser aprovado numa disciplina, é necessário:
    I. Frequência não inferior a 75% da carga horária da disciplina;
    II. Média Final maior ou igual a 6.

Comentários

  1. Menção en passant de Egbert Schuurman (professor universitário da Holanda) no livro “Fé, Esperança e Tecnologia: ciência e fé cristã em uma cultura tecnológica” sobre a autogestão gerando ineficiência e rigidez nas universidades:”O princípio da responsabilidade dos empregados em si é algo excelente, mas, quando se torna o ponto de vista dominante, surge uma cultura de infindáveis reuniões e discussões, na qual a empresa perde grandemente. Nas décadas de 60 e 70 testemunhamos o fracasso dessa mentalidade ética nas universidades. Uma ‘cultura de comitês [comissões]’ surgiu, na qual todo tipo de situações ligadas à educação e aos estudos eram discutidas e decididas, mas muito pouco se via em termos de uma verdadeira educação e estudo. Adotavam-se regras aos montes, mas o resultado era um quadro regulatório rígido e não a liberdade.”
    (Egbert Schuurman: Fé, Esperança e Tecnologia: ciência e fé cristã em uma cultura tecnológica. Editora Ultimato: 2016:  p.223. )

Por enquanto, é isso!